GAROTO, EU ODEIO AMAR VOCÊ ~ [42] ~ EU SEI QUEM É O GOSSIP
Li aquela mensagem uma, duas, três vezes. As letras dançavam na minha frente enquanto meu cérebro se recusava a processar o que estava vendo. Não podia ser. Não podia ser verdade. Meu celular começou a tocar imediatamente. Era Taty, chorando tanto que mal conseguia falar. — Como... como... — foi tudo que consegui dizer. — Ela... ela tomou remédios — Taty soluçava do outro lado da linha — Os pais dela a encontraram de manhã... ela deixou uma carta... O mundo inteiro desabou sobre mim naquele instante. Minhas pernas cederam e caí sentado no chão do meu quarto, o olhar fixo no porta-retrato que ela tinha me dado na noite anterior. Nossas caras sorridentes, sem saber o que viria depois. Comecei a tremer. Um calafrio percorreu meu corpo enquanto as lágrimas escorriam sem que eu as sentisse. O celular escorregou das minhas mãos, e eu conseguia ouvir a voz distante de Taty me chamando. Ela tinha me dado aquele presente sabendo o que faria depois. Ela tinha me abraçado, me olhado nos olhos, sabendo que seria a última vez. Ela tinha planejado tudo. E eu, eu tinha sentido algo. Aquele impulso de beijá-la, de abraçá-la uma última vez, de dizer que a amava. Será que alguma parte de mim sabia? Será que poderíamos ter evitado? Eu comecei a chorar desesperadamente, a dor de perder um amigo, de perder alguém tão próximo e cheio de vida. Eu não poderia nunca descrever em palavras tudo aquilo que eu sentia, o choro, a raiva, a lembrança. Eu estava no meu quarto chorando no chão, quando a porta se abriu. Era o Carlos, ele me olhou e eu comecei a chorar mais ainda. Ele me abraçou e não disse nada, ficamos em silêncio. Então eu disse: — Foi você que contou pro gossip sobre a Chanel? — Eu? Claro que não, eu não mando nada pro gossip, jamais faria isso. — A Chanel me contou que você sabia que ela tinha HIV. Desculpa te acusar, mas quero matar essa gossip, descobrir quem é. — Falei com meu pai, ele vai tentar dar um jeito de rastrear o IP. Quem fez isso tem que pagar. — Obrigado — falei abraçando o Carlos e começando a chorar novamente. Logo depois Taty, Yan e Isaac chegaram na minha casa, e todos nos abraçamos, choramos. Yan e Taty deram mais detalhes: ela havia tomado vários comprimidos, e pela manhã os pais a encontraram já sem vida. Tínhamos que nos preparar para o velório e o enterro, e eu não sei se seria capaz disso. Eu estava chorando completamente abalado, comecei a chorar alto, e o Carlos estava lá ao meu lado, o que me tranquilizava de certa forma. À noite o velório começou. Eu não tive coragem de olhar o corpo da Chanel. Seus pais estavam sérios, como se não acreditassem. Muitos outros alunos foram, inclusive o Luke que se juntou a gente. O enterro seria pela manhã, então o Luke chamou todos para sua casa, mas eu disse que não iria, queria ficar sozinho, queria ir pra minha casa. Então o Carlos disse que iria comigo. O Carlos dormiu comigo, mas não aconteceu nada. Inclusive não conversamos sobre absolutamente nada, apenas dormimos e choramos juntos. De manhã acordei, o Carlos não estava na cama. Então alguns segundos depois ele entra com o Thanos: — Fui passear com o Thanos. — Obrigado. — O enterro é agora às 10h. Vai se arrumar, sua mãe vai levar a gente. E então fui tomar meu banho. Assim que saí, o Carlos passou por mim e não disse nada. Era estranho ter a presença dele, era como se ele estivesse e não estivesse ali. Ele não me olhava, não conversava comigo, não me tocava, apenas falava o básico, mas isso me ajudou de certa forma. Ele era o apoio que eu tinha naquele momento. Coloquei uma roupa preta e então fomos enterrar nossa amiga. No enterro o clima era profundamente triste. Meus olhos vermelhos, os dos nossos amigos, e de outras pessoas também. E então a pessoa que estava fazendo a cerimônia perguntou se alguém queria dizer algumas palavras. Eu disse que queria. Não tinha ensaiado nada, não sabia o que dizer, mas eu precisava falar, precisava me despedir, precisava contar o quão importante foi a sua amizade. Caminhei lentamente até o lugar indicado, as pernas tremendo como se fossem ceder a qualquer momento. Olhei para o caixão fechado, depois para os rostos que me observavam. Os pais de Antonio na primeira fileira, seus olhares vazios me atravessando. Respirei fundo e comecei a falar. — Eu... — minha voz falhou imediatamente e precisei pigarrear para continuar — Eu conheci Antonio esse ano. Desde o primeiro dia, ele foi como uma luz na minha vida. Minha voz estava trêmula, mas tentei me manter firme, por ele. — Muitos de vocês o conheciam apenas como Antonio, mas para aqueles que tiveram o privilégio de realmente conhecê-lo, sabiam que ele era muito mais que um nome. Ele era risada nos dias difíceis. Era abraço quando ninguém mais oferecia. Era a mão estendida quando todos viravam as costas. Senti as lágrimas começando a descer pelo meu rosto, mas continuei. — Quando passei pelos momentos mais sombrios da minha vida, quando a depressão me puxava para baixo como um peso de chumbo, foi Antonio quem sentou ao meu lado uma noite. Foi ele quem disse: "Não vou te deixar afundar." E não deixou. Minha voz quebrou completamente e precisei parar. Carlos se levantou como se fosse vir até mim, mas balancei a cabeça levemente e ele voltou a se sentar. Respirei fundo várias vezes. — Me desculpem... — sussurrei, tentando me recompor. — Vocês sabem que Antonio tinha esse dom de fazer qualquer situação parecer mais leve. Ele transformava tragédias em anedotas, dores em lições. Ele vivia intensamente cada segundo como se fosse o último. As lágrimas agora caíam livremente, e eu nem tentava mais contê-las. — Ele me ensinou a ver beleza onde ninguém mais via. Ensinou a rir quando só queria chorar. Ensinou a amar sem medo, mesmo quando o mundo dizia que não devíamos. Olhei para os pais dele, que tentavam se manter fortes. — Antonio amava vocês mais que tudo. A mãe dele começou a chorar mais intensamente, o pai a abraçou forte. — Eu fui a última pessoa... — minha voz falhou novamente, e desta vez precisei parar por vários segundos, sentindo o peso dessa realidade me esmagar — Eu fui a última pessoa a ver Antonio com vida. Um soluço incontrolável escapou da minha garganta, e cobri o rosto com as mãos. Alguém se aproximou e colocou a mão no meu ombro. Era Taty, que ficou ao meu lado em silêncio enquanto eu tentava recuperar o fôlego. — Na noite anterior... ele me deu um presente. Um porta-retrato com nossa foto. E agora entendo que... que aquele foi o jeito dele de se despedir. Olhei novamente para o caixão. — Ele me abraçou tão forte naquela noite. Me olhou nos olhos de um jeito que nunca tinha feito antes. E eu senti que havia algo diferente, mas não consegui entender o que era. Se eu soubesse... — minha voz falhou novamente — Se eu soubesse que seria a última vez... Não consegui terminar a frase. O choro tomou conta de mim por completo. Ouvi soluços por toda a parte. — O sorriso dele naquela última noite... era um sorriso diferente. Não era o sorriso radiante que todos conhecíamos. Era um sorriso de quem já tinha feito as pazes com algo que nós não podíamos ver. Eu deveria ter percebido. Eu deveria... Balancei a cabeça, incapaz de continuar por alguns segundos. — Antonio, você partiu cedo demais. Tinha tanto para viver, tanto para compartilhar. Queria ter tido a chance de te dizer o quanto você era importante, o quanto você mudou minha vida, o quanto eu te amava. Respirei fundo uma última vez. — Você vai viver em cada risada que dermos lembrando de você. Em cada história que contarmos sobre as loucuras que vivemos juntos. Em cada vez que alguém disser "A Antonio teria amado isso". Você nunca vai realmente partir enquanto continuarmos te carregando em nossos corações. Olhei para o céu por um momento. — Descanse em paz, meu amigo. Obrigado por ter existido na minha vida. Não consegui dizer mais nada. Meus joelhos finalmente cederam e Taty me segurou enquanto eu desabava em um choro convulsivo. Carlos veio correndo e me ajudou a voltar para o meu lugar. Os soluços eram tão fortes que eu mal conseguia respirar. O silêncio que se seguiu foi quebrado apenas pelo som do choro coletivo. Naquele momento, todos sentíamos a mesma dor, o mesmo vazio deixado por alguém que partiu cedo demais. Conviver com a dor e com a perda de alguém tão repentina me fez crescer de certo modo. Eu estive numa situação parecida com a da Chanel, eu tentei me suicidar, mas fui forte. Eu não conseguia entender o porquê ela havia feito aquilo. Será que era algo já planejado ou foi depois do gossip? A verdade é que depois que o gossip postou sobre o HIV, ela mudou. Ela ficou abalada de certa forma, e eu queria descobrir quem era. Após o velório, Carlos ficou novamente comigo. Ficamos em silêncio. Ele brincava vez ou outra com o Thanos, mas eu permaneci na minha, estava sem força pra pensar ou falar. Eu fechava os olhos e me lembrava da Chanel dançando, falando... seria uma falta difícil de superar. No outro dia pela manhã, Carlos levou Thanos pra passear, o que não achei ruim. Eu estava sem forças até pra dar atenção ao meu cachorro. Ele então se despediu de mim: — Tô indo embora, Lucas. Fica bem! — Já? — falei, fitando meu olhar no dele. — Já passei tempo demais aqui. Você precisa ser forte. Quis passar esse tempo com você porque tivemos uma história — eu, você e a Chanel — mesmo que pouca. Me senti obrigado a estar com você e tentar dar um apoio, mas não passou disso. Tudo volta a ser como antes. — Carlos, por favor? Podemos ser amigos? — Não, Lucas. Eu ainda te amo muito. Não vou conseguir separar as coisas. — Eu também te amo, Carlos. Não quero você longe de mim. — Ter ficado longe de você foi a melhor coisa que me aconteceu nos últimos 6 meses. Preciso ir. Fica bem. E então, sem dizer mais nenhuma palavra, sem ter me dado qualquer chance, o Carlos foi embora. Mas não me permiti chorar. Por um lado, ele tinha razão. Seria difícil manter uma amizade com o tanto de sentimentos que tínhamos um pelo outro, mas eu amava o Carlos. Ele mexia comigo de uma maneira difícil de explicar. Naquela tarde, o Luke mandou uma mensagem no nosso grupo: "Preciso de todos vocês aqui em casa, eu sei quem é o gossip." Meus olhos se arregalaram. E se for alguém conhecido? E se for o Luke? Ele poderia ter sido esse tempo todo. Mil coisas se passaram na minha mente. Então me arrumei e fui para casa do Luke. Quando cheguei lá, o Yan e Isaac já estavam, e a Taty estava a caminho: — Fala logo quem é o gossip — cheguei falando. — Calma, vou esperar a Taty chegar. Precisamos pensar o que vamos fazer. — O gossip deletou o perfil desde a morte da Chanel — disse o Yan. — Deve ter ficado com medo. O pai do Carlos ia tentar rastrear o IP, só não sei como — falei. — Não será preciso. Eu sei quem é. — Fala logo — eu disse, perdendo a paciência. E então a Taty chegou. — Cheguei. E aí, vamos quebrar a cara de quem? — falou a Taty. — Vai, Luke, desembucha logo. — Vocês sabem que eu estava com o Theo, um dos gêmeos... Bom, uma vez eu fui mexer no celular dele enquanto ele dormia, e bom... eu vi a conta da gossip logada no celular dele. É ele o gossip. Ele e Thomas, os dois gêmeos — falou o Luke. — Eu sabia! Nunca fui com a cara daquele idiota. Eu vou matar ele — falei revoltado. — Lucas, por favor, não podemos acusar ninguém assim sem provas. E tem outra coisa, falei com meu pai, a gente não pode fazer absolutamente nada. Os pais da Chanel precisariam denunciar, eles precisariam saber de muitos detalhes, e eles são velhos, acho que não iriam entender e nós iríamos manchar a imagem da Chanel. Eu não acho que isso seja uma boa ideia. — E eles vão ficar impunes? — perguntei. — Lucas, não estou defendendo, mas não sei... a Chanel agiu estranho no último tempo. Naquele dia que falávamos da formatura, ela falou como se não fosse. Então eu acho que ela já estava planejando algo, porque o gossip postou depois do ENEM — falou a Taty. — Eles nunca gostaram da Chanel, sempre atacaram. Inventaram aquela história que ela tinha roubado as coisas da mãe do Luke, entre outras coisas ao longo do ano. — Mas a gente não pode fazer nada legalmente — disse o Yan. — Sim, LEGALMENTE não podemos fazer nada — disse o Luke — mas concordo com o Lucas. A gente precisa pensar em algo pra vingar a nossa amiga. Por mais que esse não tenha sido o motivo que levou ela a fazer isso, eles atacaram ela ao longo do ano à toa. — O que você pensa? — disse o Isaac. — Acho que devemos confrontar e fazer eles assumirem a culpa, pelo menos assumirem que realmente são os gossip. E então a gente faz a má fama deles. A cidade é pequena, eles vão pra faculdade, e as pessoas podem saber o quão perigosos e venenosos eles são. Isso seria um caminho mais "saudável" — disse o Luke — Mas a gente pode dar uma surra neles, mandar algum "capanga" do meu pai bater neles, sei lá. Sinceramente, não sei. — Gente, não vamos envolver violência. O que nós nos tornaríamos? Monstros? — disse o Yan — A gente pode se ferrar. Vamos começar nossa vida agora. Eu prefiro queimar eles, a gente deixar que todos saibam quem são eles. O certo seria os pais abrirem uma investigação, mas eu não concordo com isso. O pai da Chanel era homofóbico pelo que a Chanel nos contava, então existe a possibilidade de isso não dar em nada. Então... sinceramente, acho que não devemos fazer nada. — Tudo bem, então não vamos fazer nada? — falei. — Vamos confrontar eles, fazê-los assumir que são o gossip. Acho que esse é o caminho. E com isso, não só a gente tenha a certeza, como todos os alunos do LEI. Então eles terão essa fama pro resto da vida, que mataram uma pessoa por fofoca, e as pessoas não vão confiar neles. Esse é o certo a se fazer — disse o Luke. — Todos concordam? — disse a Taty. E um a um foram concordando, mas eu não iria deixar isso barato. Eu tinha raiva dos gêmeos por eles terem ficado com o Luke, por terem falado coisas de mim, da Camille e do Carlos. Eu não iria deixar isso barato. Eu só precisaria decidir o que eu iria fazer.
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Eu sou um péssimo ser humano, porque na hora do discurso eu iria falar sobre quem era o Antônio e o que, provavelmente, o matou: o preconceito dos pais. Os pais de Chanel iriam me odiar pra sempre, mas eu não perderia a oportunidade de falar sobre como a falta de amor incondicional por parte dos pais foi o que tirou a vida de Chanel. Sem falar q eu TB daria uma boa surra nos gêmeos, além da exposição pública. Mas o discurso de Lucas foi lindo e expor já é bom
To acompanhando desde o começo., esse remake, já que eu já tinha lido o anterior. E agora chorando copiosamente com a despedida da Chanel. Minha nossa! Como ela dizia: “que bafão é esse?”
Que sensibilidade no discurso do Lucas… eu amo esse garoto… julgado por dar vazão às suas vontades, ( vontades essas que todos temos, é só olhar os perfis aqui rs)… gente julgando por ele nao conseguir cumprir a “missão da fidelidade” aff hipocrisia… aliás a mesma que oprimiu a matou a Channel, linda e reprimida, tendo que ser homenageada na sua despedida pelo personagem que criaram pra ela… contodelukas qta grandeza na sua alma pra escrever com tanta profundidade
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