Conversa entre irmãs.

Estávamos sentadas no chão do quarto, cercadas de malas abertas e abas de sites de viagem piscando na tela do notebook.
— Fim de ano pede ousadia — eu disse, esticando as pernas. — Nada de roteiro certinho demais.
Minha irmã riu.
— Você falando isso já é um sinal de que quer aprontar alguma coisa.
— Não aprontar — corrigi. — Testar. Sentir. Aproveitar que ninguém conhece a gente fora daqui.
Ela me olhou de lado, curiosa.
— Tipo o quê?
Girei o elástico no pulso, fingindo pensar mais do que realmente precisava.
— Tipo descobrir se eu realmente gosto de seguir ordens… ou se isso é só coisa da minha cabeça.
Ela abriu um sorriso lento.
— Ah. Então é isso que anda passando pela sua cabeça ultimamente.
— Não assim, do jeito que você está pensando — retruquei, rindo. — Mas eu gosto da ideia de alguém saber exatamente o que quer… e eu só acompanhar.
— Engraçado porque eu sempre tive curiosidade de ver até onde dá pra ir quando ninguém me pede pra ser discreta. — Ela me disse isso quase em tom de confissão.
Levantei as sobrancelhas.
— Olha só nós duas planejando férias e, ao mesmo tempo, versões alternativas de nós mesmas.
— Férias servem pra isso — ela disse. — A gente sai da rotina, sai do papel de sempre… e vê o que sobra.
Ficamos em silêncio por um instante. Não constrangedor. Aquele silêncio confortável de quem pode dizer qualquer coisa sem ser julgada.
— Não estou dizendo que vou fazer algo — comentei. — Só quero estar num lugar onde, se acontecer… aconteceu.
Ela sorriu.

— Se eu for sincera — eu disse, baixando a voz —, eu quero viajar pra um lugar onde eu possa flertar sem pensar duas vezes. Onde ninguém me conheça pelo nome.
Ela riu novamente e me olhou com cara de safada, ela entendeu o que eu queria dizer
— Você quer anonimato. Isso já diz bastante.
— Quero liberdade — corrigi. — Quero sentir aquele frio na barriga de não saber onde uma conversa vai dar.
— Hm… — ela respondeu, pensativa. — Eu sempre tive curiosidade de testar meus limites. Ver até onde consigo provocar sem prometer nada. Só pelo prazer de perceber o efeito que causo.
— Você sempre gostou de se exibir— provoquei.
— E você sempre gostou de perder o controle — ela rebateu rápido demais. — Não perder de verdade. Só… entregar por escolha.
Sorri, sem negar.
— Talvez. Às vezes imagino como seria estar com alguém a ponto de não precisar conduzir nada. Só reagir.
— Eu imagino o contrário — ela disse. — Dizer e fazer exatamente o que quero, sem suavizar. Ver se alguém acompanha.
— Férias são perigosas — comentei. — A gente começa querendo descanso e termina querendo experiências.
— Ainda bem — ela respondeu. — Já pensou voltar igual a como saiu?
—Quero voltar com histórias que não dá pra contar pra todo mundo.
Ela me olhou com aquele sorriso cúmplice.
— Então vamos escolher um destino à altura. Lugares certos despertam vontades que ficam quietas o ano inteiro.
— E coragem — acrescentei.
— Principalmente coragem — ela concordou.
— Então escolhe bem o destino. Lugares certos deixam as pessoas mais… abertas.
—Aberta em que sentido? — não pude deixar de fazer essa piada.
—Em todos os sentidos, mente aberta e pernas abertas. — Ela respondeu rindo e eu não consegui evitar de rir junto.
— E você? — perguntei. — Vai testar suas teorias também?
— Talvez — respondeu, dando de ombros. — Ou talvez eu só observe. Às vezes observar já é excitante o suficiente.
Balancei a cabeça, rindo.
— Essas férias prometem.
Ela pegou o celular e mostrou uma cidade litorânea na tela.
— Começa por aqui. Depois, o resto a gente deixa acontecer.
Enquanto voltávamos a falar de hotéis e passagens, eu já sabia: aquela viagem não era só sobre descanso. Era sobre permitir que desejos guardados, ainda sem forma definida, finalmente tivessem espaço para existir.
E isso, por si só, já era o bastante.
Continua ...


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Ficha do conto

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Nome do conto:
Conversa entre irmãs.

Codigo do conto:
250179

Categoria:
Confissão

Data da Publicação:
26/12/2025

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