Essa dimensão é reforçada pela imagem das hermas: pilares fálicos com a cabeça de Hermes no topo e o falo ereto na base, colocados nas estradas para marcar fronteiras, proteger viajantes e afastar o mal. Essas esculturas associam o falo ao sentido de orientação, firmeza e proteção — não como barreira, mas como afirmação de presença. O falo mercurial marca a travessia como afirmação do ser. Ele diz: aqui começa um novo caminho, e eu sou a força que atravessa. Nessa perspectiva, o falo é a própria vara do viajante: guia, apoio e cetro.
Monik o chama de “falo mercurial” porque ele é também uma imagem do espírito — do logos em movimento. É o falo que fala, que pensa, que engendra sentido. O falo de Mercúrio é filosófico e poético: ele expressa a força do pensamento encarnado, do verbo criador, da linguagem fecundante. Como mensageiro dos deuses, Hermes porta tanto o bastão quanto a palavra. Seu falo, portanto, não é só instrumento de prazer ou procriação, mas também de criação simbólica — o que exala, projeta e semeia ideias. Daí a associação ao logos spermatikos: a palavra que fecunda o mundo.
O falo de Mercúrio também é ambíguo e paradoxal — como tudo que tem poder de transitar entre opostos. Ele é brincalhão e sério, veloz e estável, sedutor e sagrado. Ele rouba e devolve, cruza fronteiras e estabelece limites. É o falo do trickster: aquele que engana para revelar, que desordena para instaurar nova ordem. E por isso mesmo, seu falo é o da inteligência viva, da libido transformadora, do impulso que não se contenta em repetir, mas que inventa. Nele, o desejo não é cego — é arguto, sutil, incansável.
Por fim, o falo de Mercúrio é, acima de tudo, expressão de liberdade e leveza. Não impõe, convida. Não invade, atravessa. Ele não é o falo de Marte, guerreiro e frontal, nem o falo de Cronos, severo e fatal. O falo de Mercúrio é dançante, insinuante, ágil — está sempre entre, sempre além. É o falo da linguagem, do encontro e da travessia. E por isso, mesmo sendo símbolo fálico, transcende a pura genitalidade: ele se torna ponte entre corpos, almas, signos e destinos.