Estava ali para passar o fim de semana com o vô Alcides. Minha mãe, com quem tenho uma relação distante, insistira: “Faz bem você conhecer suas raízes, Pri. E seu avô está tão sozinho lá naquela roça”. A verdade que eu não contava a ninguém, nem a mim mesma direito, era que, desde que as coisas com papai tinham se tornado aquela chama constante e proibida, um cansaço peculiar se instalara em mim. Uma necessidade de sair daquele ciclo, mesmo que por dois dias. E, secretamente, uma curiosidade mórbida. O sangue era o mesmo, afinal.
Um velho caminhonete Chevrolet 74, vermelho desbotado pela ferrugem, estava estacionado à sombra de um pé de manga. E ao lado dele, encostado na porta, estava ele.
Vô Alcides.
Ele não era como eu lembrava da última visita, quando eu era adolescente. O tempo – ou a solidão – tinha trabalhado nele de forma brutal e fascinante. Altão, acima de 1,90m, seus ombros largos ainda sustentavam uma estrutura poderosa, embora um pouco curvada. O rosto era um mapa de rugas profundas, talhadas por sol e vento, sob um chapéu de palha desbotado. Seus braços, visíveis pela camisa xadrez verde desbotada e arregaçada até os cotovelos, eram cordas de músculos e veias salientes, cobertos por uma densa camada de pelos grisalhos. As mãos… Deus, as mãos. Eram duas pás, com dedos grossos, nós salientes e unhas curtas e sujas de terra. Mãos que tinham domado cavalos, derrubado árvores, construído uma vida do nada.
Seus olhos, porém, eram o que me prenderam. De um azul quase desbotado, como o céu de inverno do Paraná, eles me percorreram do topo do meu rabo de cavalo loiro até a ponta dos meus tênis, e depois subiram novamente, parando no decote da minha blusa de alcinhas. Não havia a doçura vaga que eu esperava. Havia uma avaliação silenciosa, intensa, de caçador.
“Pri,” sua voz ecoou, grave e áspera como pedras se arrastando. “Cresceu.”
“Oi, vô,” disse, tentando um sorriso. Minha voz soou estranhamente pequena.
Ele não sorriu de volta. Apenuou, pegou minha mochila – seus dedos enormes envolveram completamente a alça – e jogou-a na caçamba da caminhonete como se fosse um saco de penas. “Vamos. A casa é longe daqui.”
A “casa” era uma construção de madeira rústica, sólida, no alto de uma colina, cercada por pinheiros e com uma vista desimpedida para vales e plantações. Não havia cercas visíveis. Apenas a natureza e a morada dele. O interior cheirava a lenha queimada, café forte e couro envelhecido. Era um cheiro masculino, primitivo.
“Seu quarto é ali,” ele apontou para um corredor escuro. “Banheiro é fora. Água é do poço. Se quiser quente, esquenta na lenha.”
A noite caiu rápido sobre Roncador, um manto de escuridão muito mais absoluta do que na cidade. Depois de uma janta silenciosa de feijão, arroz e um frango caipira duríssimo – que ele mesmo abatera, eu ouvira o alvoroço no galinheiro mais cedo –, sentei-me na varanda. Ele estava alguns metros à frente, afiando um facão enorme numa pedra de amolar, o shink-shink rítmico sendo a única música na escuridão. O luar prateado iluminava seu perfil de lobo velho, os músculos de seu antebraço se flexionando a cada passada.
“Sua mãe disse que você tá estudando na cidade,” ele falou, sem levantar os olhos do facão. “Diz que é bonita e vivaz. Que tem olhos de quem viu coisa.”
Eu senti um frio na espinha. “O que isso quer dizer, vô?”
Ele parou de afiar. Virou aqueles olhos azuis para mim. Na penumbra, eles pareciam brilhar com uma luz própria. “Quer dizer que você não tem cara de menina boba. Tem cara de mulher que conhece o seu valor. E o valor que tem para os homens.”
Meu coração começou a bater forte. “Não sei do que o senhor está falando.”
Ele soltou um grunhido que poderia ser uma risada seca. “Tá. O banheiro é naquele casebre menor. Vai antes de dormir. O mato à noite não é lugar para você.”
A afirmação soou mais como uma ordem do que um conselho. Com as pernas um pouco trêmulas, peguei minha toalha e meu nécessaire. O “casebre” era, na verdade, um banheiro espartano de madeira, com um buraco no chão e um balde d’água. Um lampião de querosene iluminava o interior.
Estava me lavando, o pano úmido deslizando sobre meus seios, minha mente confusa com as insinuações dele, quando ouvi o rangido da porta. Antes que pudesse reagir, a figura enorme do vô Alcides preencheu o vão da porta. Ele estava apenas de calça de brim surrada, suspensórios caídos sobre seus ombros nus. O torso era uma paisagem de músculos envelhecidos mas poderosos, tatuagens desbotadas de marinheiro e uma mata de pelos brancos e grossos que descia do peito até desaparecer na cintura da calça.
“Esqueci de avisar,” sua voz soou rouca, diferente. “A fechadura tá quebrada.”
Eu me encolhi, tentando cobrir-me com a toalha minúscula. “Vô… eu…”
Ele não se moveu. Seus olhos percorreram meu corpo encoberto pelo pano úmido que deixava tudo à mostra. “Você é a viva cara da sua avó. Ela também era loira. Também tinha esse fogo no olhar.” Ele fechou a porta lentamente. O click da tranca – que claramente não estava quebrada – ecoou como um tiro. “E ela também gostava de coisas que não eram próprias.”
O ar saiu dos meus pulmões. Eu estava encurralada. O medo era uma coisa aguda, mas, para meu horror absoluto, uma outra sensação começou a brotar sob ele. Um calor profundo e proibido. Aquele homem enorme, velho, meu avô, emanava uma energia animal que fazia o ar ficar pesado.
“Por favor,” sussurrei, sem saber pelo que estava pedindo.
Ele deu um passo à frente. A mão dele, aquela pá com dedos grossos, levantou-se e puxou a toalha que eu segurava com força. Ela cedeu com um estalido. Fiquei completamente nua diante dele, iluminada pelo lampião trêmulo.
Ele não disse uma palavra. Apenas olhou. Seu olhar era como um toque físico, percorrendo cada curva, cada detalhe. Parou no meu triângulo loiro, depois subiu para meus seios, onde meus mamilos já estavam endurecidos, traidores, contra o ar frio.
“Linda,” ele murmurou, mais para si mesmo. “Linda e pecadora.”
Então, ele agiu. Não com violência, mas com uma autoridade absoluta que não admitia discussão. Girou-me de costas para ele e me dobrou sobre o banco de madeira próximo ao balde, minha cintura apoiada na borda dura. Minhas mãos se agarraram às tábuas ásperas. Eu podia ouvir o barulho da sua calça sendo aberta.
“Vô… não pode…” gemi, mas meu corpo não se moveu para fugir. Minha buceta estava latejando, umedecendo de uma forma que me encheu de vergonha.
“Pode, sim,” sua voz veio por cima de mim, quente e úmida no meu ouvido. “O sangue sabe. O sangue chama.”
Senti a pressão na minha entrada. Não era a cabeça lisa de um homem mais novo. Era algo enorme, rugoso, realmente enorme. Ele não usou saliva, nem cuidado. Cuspiu na própria mão, esfregou em si mesmo e em mim, e então, com um único movimento firme e implacável de seus quadris poderosos, ele se enterrou em mim.
Um grito engasgado saiu da minha garganta. Era uma dor aguda, uma expansão brutal. Ele era largo, tão largo, e parecia não ter fim. Seus braços, aqueles braços de lenhador, cercaram meu torso, uma mão subindo para agarrar meu seio, os dedos grossos beliscando meu mamilo com força, enquanto a outra mão segurava meu quadril com uma garra de ferro.
“Isso… isso aqui era da sua avó,” ele rosnou, enquanto começava a se mover. Os movimentos eram lentos, profundos, cada arremetida uma conquista de território. A madeira do banco rangia em protesto sob nosso peso combinado. “E agora é meu outra vez. Pela sua mãe… e por você.”
A revelação caiu sobre mim como um balde de água gelada e quente ao mesmo tempo. O mundo girou. Mas o corpo… o corpo respondia. A dor inicial transformou-se em uma plenitude avassaladora, em uma sensação de ser preenchida além de qualquer limite conhecido. Ele me fodia com a cadência rítmica e impiedosa de quem acertava uma machadada em um tronco. Cada estocada fazia meu corpo ser lançado para frente, meus seios balançando, meus gemidos sendo arrancados a cada embate.
“Gosta, eh? Sentiu de quem veio, sua puta linda?” ele gozou, sua voz um rugido abafado. Sua mão no meu quadril apertou com força quase ossuda, enquanto a outra desceu da minha cintura, passou por sobre o meu púbis e encontrou meu clitóris, já inchado e pulsante. Seus dedos ásperos, cheios de calos, esfregaram-no com uma pressão precisa e cruel.
Foi a combinação final. A dor, a plenitude, a proibição absoluta, o toque rude. Um orgasmo me arrebatou, violento e silencioso, um tremor convulsivo que percorreu todo o meu corpo e fez minhas pernas vacilarem. Eu me contraía em torno dele, e isso pareceu ser o estopim.
Ele enterrou-se até as bolas, que batiam pesadas contra mim, e soltou um gemido gutural, de animal ferido. Senti o jorro quente inundando meu interior, jato após jato, uma marca de posse primordial. Ele ficou ali, imóvel, pesado sobre mim, ofegando em meu pescoço, enquanto os últimos espasmos do meu próprio prazer percorriam meu ventre.
Quando ele se retirou, foi com um som úmido e obsceno. Fiquei dobrada sobre o banco, incapaz de me mover, sentindo suas sementes quentes começarem a escorrer por minhas coxas, misturando-se à água do balde no chão de terra batida.
Ele se arrumou em silêncio. Antes de sair, parou na porta. Não olhou para trás.
“Amanhã cedo tem serviço na roça. Você vai ajudar,” disse, sua voz de volta àquela aspereza normal, como se nada tivesse acontecido. “E aprende: algumas raízes são fundas demais. E quando você puxa, vem tudo.”
A porta se fechou. Fiquei sozinha, nua, marcada e transformada no banheiro escuro, com o cheiro dele, da terra e do meu próprio pecado enchendo minhas narinas. O fim de semana em Roncador tinha apenas começado, e eu, tinha acabado de descobrir que as árvores genealógicas, às vezes, têm galhos que se entrelaçam de maneiras muito sombrias, muito profundas, e impossíveis de podar.