Capítulo 1: A Chegada a Santa Maria das Rosas O tilintar monótono do sino da torre, ecoando pelas oliveiras ressequidas sob o sol inclemente da Andaluzia, foi o primeiro som que Marta registrou. Não era o badalar alegre dos sinos da sua aldeia natal, mas um lamento grave, um chamado a algo que ela ainda não compreendia. A carruagem, uma caixa apertada e empoeirada, finalmente parou. Pela pequena janela, viu a imponente fachada do Convento de Santa Maria das Rosas, erguendo-se como uma fortaleza de pedra contra o azul vibrante do céu. Paredes grossas, sem janelas visíveis, exceto por algumas frestas estreitas no alto, davam-lhe a aparência de uma prisão, não de um refúgio. Aos vinte anos, Marta era uma tela em branco, intocada pela vida ou pelos prazeres. Sua pele alva, quase translúcida, e os olhos grandes e curiosos eram o espelho de uma alma virgem, assustada e, ao mesmo tempo, estranhamente intrigada. Vivera uma existência simples e protegida, ditada pelos ritmos da terra e pelos preceitos da fé, mas jamais pela clausura. A decisão de entrar para o convento não havia sido sua, mas imposta por uma família que via na vida religiosa uma forma honrosa de lidar com a falta de um dote adequado. O pensamento de um futuro sem marido, sem filhos, sem a doçura e as asperezas da vida conjugal, era um vazio que a amedrontava mais do que a própria morte. A porta da carruagem abriu-se, revelando uma pequena figura vestida de hábito escuro. Era a Madre Superiora, Irmã Inês, uma mulher de rosto vincado por anos de jejum e oração, mas com olhos que, apesar de severos, pareciam carregar uma estranha melancolia. — Seja bem-vinda, filha — disse com a voz rouca, quase num sussurro. — O Convento de Santa Maria das Rosas acolhe-a em seu seio. Que a paz de Cristo ilumine seu caminho. Marta desceu, as pernas bambas, a poeira da estrada colada na saia simples. O ar parado do pátio interno era pesado, impregnado de cheiro de cera antiga e incenso. Não havia flores, apenas algumas ervas murchas em canteiros de pedra e uma fonte seca no centro. O silêncio era esmagador, quebrado apenas pelo farfalhar distante das folhas de uma alfarrobeira e pelo ranger dos seus próprios sapatos. À medida que a Madre a conduzia pelos corredores frios e escuros, a sensação de mistério intensificava-se. As paredes de pedra, as abóbadas altas, as pinturas sombrias de santos e mártires… tudo parecia conspirar para sufocar qualquer vestígio de mundanismo. O convento era um labirinto de solidão, onde a vida lá fora parecia nunca ter existido. Chegaram a um salão amplo, escassamente iluminado por uma fresta no teto. Ali, um grupo de mulheres aguardavam-na. Eram as noviças e as freiras, algumas sentadas em bancos de madeira, outras de pé, com as suas silhuetas esguias e envoltas em hábitos escuros, tornando-as quase indistinguíveis. Marta sentiu os olhos delas sobre si, avaliadores, curiosos, talvez até um pouco ressentidos. A maioria era mais velha, com rostos que já carregavam as marcas da resignação e da devoção. Uma delas, contudo, destacou-se imediatamente. Era uma noviça, um pouco mais velha que Marta, talvez uns vinte e cinco anos. Os seus olhos, de um castanho intenso, eram incrivelmente expressivos, e havia uma curva sutil nos lábios que sugeria um sorriso contido, quase um segredo. Essa era Letícia, a quem Marta viria a conhecer mais tarde. Ela estava de pé, os braços cruzados sob o peito, e seu olhar demorou-se em Marta com uma intensidade que fez a novata corar. Não era um olhar de julgamento, mas de uma curiosidade quase palpável, que parecia despi-la sob o hábito simples que vestia. Ao lado de Letícia, outra figura chamou a atenção de Marta. Uma freira de cerca de trinta anos, com traços fortes e uma postura imponente. Havia uma beleza austera nela, quase selvagem, que destoava da quietude do ambiente. Os seus olhos negros e profundos olhavam para a Marta com uma franqueza perturbadora. Essa era Teresa, e Marta sentiu um arrepio percorrer a sua espinha ao cruzar o seu olhar. Havia algo nela que parecia indomável, mesmo sob o véu. A Madre Superiora fez uma breve apresentação. — Irmãs, esta é Marta. Que a recebam com a caridade e a afeição que o amor de Cristo nos ensina. As saudações foram murmuradas, vozes baixas e contidas. Não houve abraços, apenas leves inclinações de cabeça. Marta sentiu-se como um intruso num mundo que não era o seu, um mundo onde as emoções pareciam contidas e os corpos, escondidos sob camadas de tecido, existiam apenas para a devoção. A rotina do convento foi explicada: orações ao amanhecer, horas de trabalho manual, longos períodos de silêncio e meditação, refeições austeras e os banhos ao fim do dia, antes de recolherem às celas. Cada minuto do dia era preenchido com a disciplina e a penitência. O corpo era um templo a ser purificado, a mente, um campo a ser cultivado com pensamentos puros. Marta foi conduzida ao seu quarto, uma cela pequena e fria com uma cama de palha, uma cruz na parede e uma pequena janela gradeada que dava para o pátio interno. Era espartana, desprovida de qualquer conforto ou ornamento pessoal. Ali, sozinha no silêncio daquele quarto, o peso da sua nova realidade caiu sobre ela. A noite chegou, trazendo consigo uma escuridão quase absoluta. O único som era o das suas próprias batidas cardíacas. Deitada na cama dura, Marta tentou invocar as orações que sua mãe lhe ensinara, mas as palavras pareciam vazias. Em vez disso, a sua mente vagava para os rostos das mulheres que vira: a curiosidade de Letícia, a intensidade de Teresa, a serenidade misteriosa das freiras mais velhas. Um misto de medo e curiosidade começou a tomar forma dentro dela. Medo do desconhecido, da vida que a esperava, de uma existência sem os prazeres do mundo. Mas, estranhamente, uma curiosidade ainda maior a consumia. Que segredos se escondiam por trás daqueles véus? Que paixões, que anseios poderiam habitar corações dedicados a Deus? O silêncio opressor do convento, paradoxalmente, parecia amplificar cada pequena inquietação de sua alma virgem. Enquanto a escuridão engolia o pequeno quarto, Marta sentiu uma estranha premonição: a sua chegada a Santa Maria das Rosas não seria o fim de sua jornada, mas o início de uma descoberta que mudaria sua vida para sempre. (Continua)
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