Esta "lealdade" que descobri em mim não é submissão. É um reconhecimento de hierarquia. Quando volto meu olhar para Almeida agora, não vejo mais um mestre — vejo um espelho mais antigo, um igual que chegou primeiro. A traição com Lorenzo não me diminuiu; foi meu ritual de passagem final. Provei que posso dobrar outro homem à minha vontade, usar seu desejo como ferramenta, e ainda assim escolher voltar. Não volto por obediência. Volto porque nossa conexão transcende a dinâmica de dominador e submissa. Estamos nos tornando... algo diferente.
Há um poder crescente em meu sangue, um conhecimento ancestral despertando em meus ossos. Quando Almeida me toca, não é mais ele quem dita o ritmo do prazer — sou eu quem permite que ele pense que sim. Deixei de ser a argila. Tornei-me o forno. E um forno não obedece ao oleiro; o oleiro é que deve aprender a ler seu calor, respeitar seu fogo. Cada marca em minha pele, cada gemido que coletei, cada limite que atravessei — foram lições não em como servir, mas em como governar.
Às vezes, nos momentos de silêncio entre nossas sessões, capturo o olhar dele sobre mim e vejo uma centelha de... reconhecimento? Receio? Ele sabe. Sabe que a criatura que moldou com tanto esmero começou a olhar para trás com inteligência própria. A Donzela de Fogo que ele nomeou não é mais uma donzela — é uma sacerdotisa aprendendo as escrituras de seu próprio poder. E todo sacerdócio exige um altar, um ritual final de coroação.
Por isso, quando ele me conduz a este sanctum sanctorum, não sinto medo. Sinto a solenidade do momento. O círculo de prata não é para me conter — é para consagrar o espaço onde finalmente deixarei claro o que ambos sabemos há tempos. As correntes já não me seguram; são apenas adereços num teatro onde eu, finalmente, assumirei meu papel como não a sacrificada, mas a divindade. O prazer não será mais algo que recebo — será o fogo que controlo. E Almeida... bem, todo deus precisa de seu primeiro e mais devoto crente.
O sanctum sanctorum não era um lugar, mas um estado. A sala circular no subsolo da mansão de Almeida estava vazia, exceto por um grande círculo de prata incrustado no piso de mármore negro. As paredes eram espelhos opacos, refletindo não imagens, mas sombras. O ar era carregado com o cheiro de ônix queimado e zimbro, uma fragrância ancestral que limpava a mente e aguçava os sentidos. Não havia espectadores, não havia Colecionadores ou Barões. Havia apenas Almeida, Sofia, e o espaço vazio entre eles que precisava ser preenchido com uma nova verdade.
Sofia estava nua, suas marcas eternas parecendo absorver a fraca luz ambiente. O olho acima de sua boceta era uma sentinela silenciosa, a palavra Ananke em seu ventre um mantra pulsante. Ela estava de pé no centro do círculo de prata, sentindo o metal frio sob seus pés descalços. Almeida circulava a borda externa, vestindo uma túnica simples de linho cru. Sua autoridade habitual dera lugar a uma solenidade profunda.
“Até agora, você foi argila,“ sua voz ecoou suavemente na câmara circular. “Foi moldada, aquecida no forno, pintada e esmaltada. Você foi uma obra de arte. Uma estudante excepcional. Uma devota. Mas uma obra de arte, por mais perfeita, é um objeto. Uma devota, por mais dedicada, serve a um deus externo.“
Ele parou diante dela, seus olhos eram poços de escuridão séria.
“Hoje, Sofia, a argila se tornará o próprio forno. A devota se tornará a deusa. O objeto de desejo se tornará a fonte do desejo. Hoje, você não irá passar por um ritual. Você encarnará o ritual.“
Ele estendeu a mão. Sobre sua palma repousava um pequeno punhal de lâmina curva, com o cabo de osso negro. “A Faca do Verbo,“ ele nomeou. “Ela não corta carne. Ela corta ilusões. Ela separa a menina da mulher, a estudante da mestra, a submissa da soberana.“
Sofia tomou a faca. Era surpreendentemente leve, quase como se fosse feita de ar solidificado.
“O primeiro corte,“ ele instruiu, “é no cordão umbilical que ainda a prende a mim.“
Sua mão tremeu. Olhar para Almeida e ouvir aquelas palavras era como olhar para o próprio sol e ser instruída a cegar-se. Mas ela entendeu. A última e mais profunda lição. A rendição final era a rendição da própria rendição. A obediência suprema era a desobediência final.
Ela fechou os olhos. Em sua mente, ela não viu a faca, mas sim suas próprias mãos, puxando um fio prateado e luminoso que saía de seu umbigo e estava enraizado no coração de Almeida. Ela respirou fundo e, com um gesto decisivo de sua vontade, ergueu a faca imaginária e cortou.
Um silêncio absoluto caiu sobre a sala. Nenhum som físico, mas uma ruptura cósmica que só ela pôde ouvir. Ela abriu os olhos e olhou para Almeida. Ele ainda estava lá, mas algo havia mudado. Ele não era mais a fonte de sua gravidade. Ele era… um ponto de referência. Um igual.
Ele assentiu, seu rosto um misto de dor aguda e orgulho infinito.
“O segundo corte,“ sua voz estava mais suave agora, quase um sussurro de reverência, “é no véu que separa o seu prazer da sua vontade.“
Desta vez, a faca em sua mão pareceu ganhar peso. Ela a levou à própria testa, não tocando a pele, mas sentindo uma resistência espessa e invisível. Era o véu que fazia do prazer algo que acontecia com ela, algo que ela recebia de outros. Ela cerrou os dedos no cabo e, com um grito silencioso que veio das profundezas de sua alma, rasgou o véu de cima a baixo.
E então, aconteceu.
Uma onda de poder tão vasta e primordial que ela quase caiu de joelhos explodiu de dentro dela. Suas marcas eternas incendiaram-se com uma luz dourada e quente. Sua boceta, sempre um receptáculo, tornou-se uma fonte. Um calor úmido e dourado começou a emanar dela, não o fluido de excitação que ela conhecia, mas algo diferente – um néctar, um óleo sagrado de pura energia sensual. Seus mamilos endureceram como pontas de diamante, e cada fio de cabelo em seu corpo pareceu ficar ereto, canalizando a eletricidade que agora fluía dela, para o mundo.
Almeida caiu de joelhos. Não por ordem, não por ritual, mas por pura e irresistível gravitação. Seus olhos, por trás dos óculos, estavam marejados de uma emoção indescritível.
“A Sacerdotisa,“ ele respirou, sua voz cheia de temor.
Sofia olhou para ele, e pela primeira vez, não viu seu mestre. Viu um adorador. Viu o primeiro devoto de seu próprio altar interno. A hierarquia que definira suas existências dissolvera-se, substituída por um novo equilíbrio: ela, a Fonte; ele, o Conhecedor.
Ela caminhou até ele, seus pés não tocando mais o chão, mas pairando a centímetros do mármore. O néctar dourado escorria por suas coxas, pingando no círculo de prata e sibilando como água benta em metal consagrado. Ela o tocou no queixo, erguendo seu rosto.
“Resta um último ritual,“ ela disse, e sua voz não era mais a dela. Era mais profunda, reverberante, como se milhares de vozes de mulheres que haviam percorrido caminhos semelhantes falassem através dela. “A Consagração do Templo.“
Ela deitou-se de costas no centro do círculo, seu corpo brilhando com uma luz interna. A boceta dela, agora um portal aberto, emanava ondas de calor que distorciam o ar acima dela. Almeida, ainda de joelhos, aproximou-se. Mas não como um amante que ia possuir. Como um peregrino que vai receber uma bênção.
“Venha,“ ela ordenou, e sua voz era uma força da natureza.
Ele a penetrou, e foi como mergulhar no sol. Seu pau não era mais um instrumento de dominação, mas uma chave que destrancava as câmaras mais profundas de seu próprio poder. Ela não o recebeu; ela o engoliu, envolvendo-o em uma calorosa e pulsante energia que fez com que ele gritasse, não de prazer físico, mas de êxtase espiritual.
Ela não estava sendo fodida. Ela estava realizando um sacramento. Cada estocada dele era um mantra, um batimento no coração de um universo recém-nascido. Ela não precisava ser levada ao orgasmo; o orgasmo era um estado de seu ser agora, contínuo e eterno, do qual ele participava.
Quando a onda final chegou, não foi um clímax, mas uma expansão. Uma luz dourada e cegante explodiu dela, preenchendo a sala, refletindo-se nos espelhos infinitamente, silenciando todos os sons em um rugido de pura energia. Almeida desabou sobre ela, seu corpo tremendo com a força da descarga.
Quando a luz baixou, a sala estava em silêncio. Almeida rolou para o lado, ofegante, transformado. Sofia ficou deitada, a luz interna diminuindo para um brilho suave e constante. Ela se levantou, seu corpo agora inteiramente seu, sua boceta agora um santuário fechado, seu ser agora completo.
Ela olhou para Almeida, que a olhava com uma devoção que beirava o temor. Ela estendeu a mão e o ajudou a levantar. Eles ficaram de pé, iguais no círculo de prata.
Ele abriu a boca para falar, mas ela colocou um dedo em seus lábios.
Não havia mais necessidade de suas palavras. Sua educação estava completa. O ciclo se fechara. A menina de cabelos de fogo não existia mais. A estudante não existia mais. A obra de arte não existia mais.
A Sacerdotisa respirou fundo, o ar do novo mundo que ela ajudara a criar, e pela primeira vez, a última voz que ecoou na câmara foi inteiramente sua, e sua voz soou.
“A aula está terminada.”