?Miguel esperava a terceira penitente, sentindo a familiar onda de desejo predador, quando ouviu algo diferente ao lado da grade do confessionário.
A voz que chegou até ele não era um sussurro trêmulo de medo, mas um sussurro de posse.
?"Boa noite, Padre. Eu voltei para confessar."
?O sangue de Miguel gelou. Era Lúcia......
A autoridade que ele havia viciado subitamente o abandonou.
?"Eu quero que o Senhor me ajude a carregar a minha penitência," ela repetiu, mas o significado havia mudado. Ela não estava pedindo o corpo dele. "Eu vi o que o Senhor se tornou depois que saí. O seu vício. O prazer que você tira da dor e do medo. O Senhor precisa de alguém para encontrar e preparar as almas. O Senhor precisa de cumplicidade total."
?O Padre Miguel não sibilou mais um "não". O desespero se esvaiu, substituído por uma iluminação fria e terrível.
Lúcia não era sua danação; ela era sua contraparte, o único ser no mundo que o compreendia. A luxúria era um pecado solitário.
O amor por Lúcia, no entanto, seria uma aliança de almas perdidas que encontraria no mal um substituto distorcido para o fervor e para a fé. Ele se apaixonou pela certeza de não estar mais sozinho em sua perdição.
?Ele abriu a portinhola escura. O som não foi de um templo caindo, mas de um novo sendo erguido sobre as ruínas.
?"É a nossa penitência, Miguel," ela sussurrou, usando seu nome.
?O Padre Miguel estendeu a mão na penumbra e a puxou para dentro da sacristia. O amor por Lúcia era um fogo compartilhado que purificava a culpa. Eles não precisavam mais de Deus.
?A nova dinâmica
?Miguel sentiu o peso da batina não mais como uma farsa, mas como um manto de poder. Lúcia não se aninhou nos braços dele; ela o olhou nos olhos com a frieza de quem propõe um negócio.
?"Precisamos de um sistema," ela disse, a voz prática, livre de qualquer traço de luxúria de antes. "Eu não entro no confessionário. Eu ouço. Eu vejo. Eu encontro a fraqueza na fila, as que vêm buscar a absolvição com mais culpa do que fé. Você me indica a hora, e eu digo o nome. O resto é com o Padre."
?Miguel sorriu, um sorriso que não alcançou seus olhos, mas que era puramente de domínio. Não era mais sexo pelo desespero, mas sexo pelo controle e pelo ritual. Lúcia havia se tornado seu olheiro, sua recrutadora. Eles haviam transformado a salvação em uma cadeia de suprimentos de almas.
?"Vamos liderar," ele disse, e a voz, agora, não era a de um padre, nem a de um pecador, mas a de um pastor de almas perdidas.
?Lúcia assentiu e, sem pressa, ajeitou as vestes litúrgicas que ele ainda usava. Ela não era mais a penitente; ela era a primeira sacerdotisa desse novo culto.
?"A igreja é nosso território," ela confirmou. "E amanhã, na missa, todos vão nos ver juntos. Eu, na primeira fila, recebendo sua benção. A imagem perfeita da redenção."
?O ciclo havia se expandido. A luxúria tinha se tornado amor, e o Padre Miguel, com Lúcia ao seu lado, não combatia mais o pecado. Eles o governavam juntos, em uma comunhão sombria onde a batina era a coroa, e o medo, o incenso.
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