Entre elas seguia Calíope, a mais nova das iniciadas. Seu coração pulsava como tambor diante do altar. Nunca havia sentido o peso da expectativa do corpo, nem o poder que a tradição dizia nascer da entrega ao mistério.
Ao centro do templo, erguia-se a imagem de Priapo — o tronco de oliveira entalhado em forma humana, com o falo descomunal que apontava para o céu, símbolo da força divina. Chamas de azeite tremulavam à sua volta, lançando sombras vivas sobre a madeira sagrada.
A sacerdotisa, envolta em véu dourado, traçou um círculo de vinho e mel ao redor da estátua. Sua voz soou grave:
> — Que o deus desperte nas sementes e nas almas. Que o desejo da terra encontre seu eco na carne das donzelas.
As jovens se ajoelharam. O murmúrio do vento misturava-se ao som dos címbalos e flautas. Calíope manteve os olhos erguidos. Sentia o perfume do incenso penetrar-lhe a pele, o calor das tochas aquecer-lhe os ombros nus.
A sacerdotisa aproximou-se dela, tocando-lhe o rosto com as pontas dos dedos ungidas em óleo.
> — És pura como o orvalho, filha de Deméter. Que teu ventre conheça o sopro da abundância.
Então, num gesto cerimonial, conduziu Calíope até a imagem do deus. A madeira polida exalava aroma de resina e terra molhada. O chão, coberto de pétalas, parecia vibrar sob seus pés descalços.
Ela fechou os olhos. Não havia vergonha, apenas um arrepio profundo, o pressentimento de algo maior do que si. O som das flautas cresceu, e o coro das mulheres entoou o cântico que invocava a fecundidade.
Por um instante, Calíope sentiu que todo o templo respirava com ela — o vento, o fogo, o som. O calor subia-lhe do ventre ao peito, e, quando ergueu o rosto, seus olhos encontraram o da estátua. Na rigidez do deus, ela viu o reflexo de um poder antigo, primitivo, que não pertencia nem aos homens nem às mulheres, mas à própria vida.
A música cessou. O silêncio foi absoluto, cortado apenas pelo som distante das ondas. Calíope tocou o chão com as mãos, deixando escorrer o óleo sobre as pedras.
> — Que a terra me receba — murmurou. — Que Priapo me escute.
Naquela noite, o ritual consumou-se em silêncio e luz. E ao nascer do dia, quando o sol tocou o horizonte, as sacerdotisas disseram que a lua havia sorrido sobre o templo — sinal de que o deus aceitara a oferenda.
Calíope voltou ao vilarejo com o perfume do incenso preso aos cabelos e uma nova calma no peito. Sabia que algo dentro dela havia despertado. Não o medo, nem a vergonha, mas o conhecimento do próprio poder — o poder de gerar, sentir e transformar.
E quando o vento soprou sobre os campos, as flores se abriram antes da hora.
OBS: Existia de fato um ritual na Grécia antiga em que meninas virgens sentavam em cima de um grande falo de madeira que representava o deus Priapo. Esse ritual tinha como propósito garantir a fertilidade das jovens. Priapo era uma divindade associada à fertilidade, e as virgens sentavam sobre o falo gigante na esperança de se tornarem mais férteis. Esse costume estava relacionado às crenças da sociedade grega clássica, que atribuía poderes mágicos às mulheres virgens. A deformidade exagerada de Priapo, especialmente seu pênis grande e permanente, fazia parte da sua iconografia religiosa e simbólica, com rituais associados à proteção, fertilidade e até mesmo retaliação de deuses como Hera contra sua mãe Afrodite. Esse ritual é mencionado em várias fontes ligadas à mitologia grega e à antiguidade clássica



