Ele me observava em silêncio, sentado à beira da cama, como quem pressente que algo importante está prestes a ser dito.
Havia algo queimando em mim — não uma dor física, mas um chamado interno, uma vontade de mergulhar outra vez naquele espaço onde eu me encontro e me perco ao mesmo tempo.
— José… — comecei, com a voz baixa, quase um sopro. — O que aconteceu entre nós não terminou.
Ele ergueu o olhar, atento, os olhos buscando em mim o que as palavras ainda não tinham coragem de dizer.
— Não terminou porque eu não quero que termine — continuei. — Quero ir mais fundo. Quero sentir tudo de novo, mas… diferente. Quero atravessar o medo que ainda ficou.
José franziu o cenho, sem interromper.
— O que você quer sentir? — perguntou, sem ironia, apenas com aquela serenidade que sempre me desconcertava.
Demorei um pouco para responder.
— Quero sentir tudo, quero ser amarrada, apanhar e ser dominada — disse, por fim. — Mesmo que oai. Porque acho que é aí, nesse ponto em que o medo e o desejo se encontram, que a gente descobre quem realmente é.
Ele suspirou.
— Você quer dor, ou quer verdade?
— Quero a verdade — respondi. — Mas às vezes a verdade com você dói.
José se levantou e veio até mim. Tocou meu rosto com a ponta dos dedos, como se confirmasse que eu estava ali, inteira.
— O perigo é confundir as duas coisas. A dor pode ensinar, sim. Mas a verdade… a verdade cura.
Fiquei em silêncio. Ele tinha razão, mas ainda assim havia algo em mim que pedia por intensidade, por um gesto que me arrancasse do conforto.
— Então me ensina a encontrar essa verdade — pedi, enfim. — Mesmo que seja difícil. Mesmo que me doa, um pouco. E não tenha pena de mim, vá além do limite.
José sorriu, mas não com alegria — era um sorriso de compreensão.
— A verdade não é um castigo, é um espelho. Às vezes, o que arde não é o toque do outro, é o reflexo do que a gente finalmente vê.
Ele se aproximou mais.
— E você já começou a ver.
Naquele instante, compreendi.
O que eu chamava de dor era apenas o nome que dava ao medo de sentir completamente dominada.
O que eu buscava não era sofrimento, era plenitude.
Queria atravessar o limite que separa o controle da entrega, o querer do permitir.
José me abraçou devagar, e nesse gesto havia tudo: força, cuidado, verdade.
E eu me deixei ficar ali, entre o medo e o consolo, compreendendo que talvez amar — de verdade — seja isso: querer sentir mais, mas aprender que o “mais” não está na dor, e sim na coragem de permanecer aberta, inteira, quando o outro nos vê por dentro.