A Cidade (Conversas Pendentes)



O tempo corria com a pressa da cidade, mas por dentro eu ainda sentia o peso do sítio, como se parte de mim tivesse ficado lá. Já haviam se passado semanas, e mesmo assim havia algo que não me deixava em paz.
Numa noite comum, depois do jantar, sentei-me no sofá ao lado de Ricardo. O silêncio parecia maior do que o barulho da rua. Apoiei as mãos nos joelhos, respirei fundo e falei de uma vez.
Disse a ele que havia uma coisa que me incomodava desde aquele dia no apartamento. Uma ferida que não cicatrizava. Confessei que eu precisava resolver meu problema com Carina, porque não podia continuar fingindo que nada tinha acontecido. Eu a humilhei, passei dos limites, e por mais que ela tivesse me provocado, a verdade é que eu errei.
Ricardo me olhou com aquela calma que sempre me desarma. Depois de alguns segundos, respondeu que já estava tentando ajeitar isso.
Arregalei os olhos, surpresa. Perguntei por que ele não tinha me contado nada. Ele apertou minha mão e explicou. Não te falei nada porque sabia que, no fundo, você gostaria de fazer isso por si mesma. Eu conheço você, sei que não ficaria em paz enquanto não olhasse para ela e pedisse desculpas. Por isso tomei a iniciativa.
Fiquei em silêncio, sentindo o nó na garganta. Era estranho: ele levava no rosto a lembrança do meu tapa, mas mesmo assim tinha saído em meu favor, pavimentando o caminho para que eu pudesse consertar aquilo.
Encostei a cabeça em seu ombro e fechei os olhos. Disse que tinha medo da reação dela, medo de não ser perdoada. Ricardo passou a mão devagar pelos meus cabelos e falou baixo que Carina podia ser dura, mas não era injusta. Que o mais importante era eu mostrar quem realmente sou, e não a mulher descontrolada daquele dia.
O silêncio voltou, mas dessa vez era outro: não de peso, e sim de decisão. Eu sabia que não poderia adiar mais.
Naquela semana, Ricardo foi quem tomou a frente. Disse que já tinha conversado com Carina algumas vezes, de forma leve, para ir quebrando o gelo. Contou que não entrou em detalhes, mas que deixou claro que eu queria falar com ela, que precisava pedir desculpas. Ele não forçou nada, apenas plantou a semente, respeitando o tempo da irmã.
Quando me contou isso, senti um aperto no peito. Não era só nervosismo, era o peso da responsabilidade que caía sobre mim. Eu sabia que aquela conversa definiria muita coisa.
Na noite anterior ao encontro, mal consegui dormir. Fiquei deitada, mas minha mente girava sem parar. Revivia o momento em que perdi o controle, as palavras afiadas que saíram da minha boca, o tapa em Ricardo, a vergonha que me tomou depois. Cada detalhe voltava como uma faca.
O medo maior não era o de ser rejeitada, mas o de ser lembrada para sempre como aquela mulher fora de si. Eu queria que Carina me visse além da minha fúria, que entendesse que aquilo não era quem eu sou.
Levantei da cama, andei pela sala, sentei-me perto da janela. Olhei para a cidade lá fora, caótica e indiferente, e pensei que era exatamente isso: ou eu enfrentava meus próprios erros, ou seria engolida por eles.
Ricardo veio até mim, ainda sonolento, e me abraçou por trás. Disse que Carina tinha aceitado me encontrar, que o difícil já estava feito. Agora só dependia de mim. Suas palavras foram simples, mas carregavam a firmeza de quem acredita de verdade.
Abracei-o de volta, deixando meu rosto se perder em seu peito. Pedi a ele que não me deixasse fraquejar, que estivesse ao meu lado se eu travasse. Ele apenas respondeu que não havia chance de eu enfrentar isso sozinha.
Naquela madrugada, entendi que não era apenas sobre Carina. Era sobre mim mesma. Sobre provar que eu podia errar, sim, mas também ser grande o bastante para pedir perdão.
O dia chegou mais rápido do que eu esperava. O relógio parecia correr enquanto minha mente se arrastava, pesada. Ricardo me levou até o café escolhido por Carina. Era um lugar discreto, afastado do centro, com mesas pequenas e luz suave, o tipo de ambiente onde não há espaço para disfarces.
No carro, minhas mãos estavam frias apesar do calor da tarde. Eu encarava a rua pela janela, tentando me distrair, mas dentro de mim tudo girava. Perguntei a Ricardo se ele tinha certeza de que ela queria me ver. Ele respondeu que sim, que Carina tinha aceitado não apenas por ele, mas porque no fundo também precisava resolver o que ficou.
Quando descemos, minhas pernas pareciam pesar o dobro. O coração batia tão forte que eu temia que qualquer um na rua pudesse ouvir. Ricardo segurou minha mão e apertou com firmeza, como quem entrega coragem em silêncio.
Entramos no café. Ela já estava lá. Sentada em uma mesa perto da janela, Carina nos esperava com a postura ereta, o olhar fixo, quase desafiador. Não havia raiva em sua expressão, mas também não havia sorriso. Era um campo neutro, pronto para ser definido.
Respirei fundo e me aproximei. Ricardo nos apresentou de maneira simples, como se fosse a primeira vez, apagando o peso do passado por alguns segundos. Carina apenas assentiu e deixou o olhar pousar em mim.
O silêncio se alongou até que eu decidi quebrá-lo. Sentei diante dela, mantendo o olhar firme apesar do nó na garganta. Disse que estava ali porque precisava pedir desculpas. Admiti que naquele dia eu perdi o controle, que minhas palavras e meu gesto foram cruéis e injustos. Confessei que não havia justificativa que apagasse aquilo, mas que não suportava carregar a imagem de ter sido apenas aquela mulher descontrolada.
Carina permaneceu séria, me escutando sem interromper. Seus olhos tinham a firmeza de quem sabe medir cada palavra antes de entregá-la. Quando finalmente falou, sua voz saiu baixa, mas carregada de peso.
Disse que aquele dia não saíra da cabeça dela, que nunca havia se sentido tão humilhada e exposta. Mas em seguida deixou escapar algo que me atravessou de uma forma inesperada. Admitiu que, apesar da dor, havia enxergado algo em mim. Vi, eu percebi a mudança que você provocou no meu irmão. Antes, ele era frio, distante, incapaz de ser carinhoso. Eu mesma sempre cobrei isso dele e nunca consegui. Mas com você, ele mudou. Você transformou o Ricardo num homem mais doce, mais presente.
Ela respirou fundo e, por um instante, seu olhar suavizou. E por isso eu entendi você. Entendi como mulher. Sei como é o orgulho de uma mulher quando sente que está sendo traída ou feita de tola. Acho que se fosse comigo, eu teria agido até pior.
As palavras dela foram como um bálsamo inesperado. Não era só perdão, era reconhecimento. Ela não estava apenas me desculpando, mas me entendendo, validando minha dor e minha reação.
Houve outro silêncio, mas diferente daquele inicial. Não era vazio, era denso, carregado de tudo o que estava sendo colocado sobre a mesa.
Ricardo observava, discreto, sem intervir. Eu sabia que ele queria deixar que nós duas nos encontrássemos sozinhas dentro daquela conversa.
Quando Carina ergueu o olhar novamente, havia menos dureza em seus olhos. Disse que não esquecia, mas que estava disposta a perdoar. Não por mim, nem por ela mesma, mas porque era a única forma de seguir em frente sem carregar rancor.
Senti meus olhos marejarem. Agradeci baixinho, quase sem voz. Naquele instante, um peso imenso caiu dos meus ombros.
O café, a rua lá fora, até o barulho da cidade, tudo perdeu importância. O que ficou foi apenas a sensação de que uma ferida finalmente começava a cicatrizar.
O silêncio que pairava depois do perdão de Carina não era desconfortável. Era um silêncio cheio de significados, quase como se o café inteiro tivesse parado para testemunhar algo que não cabia em palavras.
Carina respirou fundo e apoiou as mãos na mesa. Seus olhos ainda tinham a firmeza de antes, mas agora havia neles algo novo, algo que parecia abrir espaço. Disse que não imaginava que aquela conversa fosse acontecer tão cedo, mas que de alguma forma estava aliviada. Acrescentou que, apesar de tudo, havia aprendido uma coisa comigo.
Olhou diretamente para Ricardo e depois voltou para mim. Falou que durante anos tentou cobrar dele mais carinho, mais delicadeza, mais cuidado, mas nunca conseguiu. Comigo, em poucas semanas, ele tinha mudado. Estava mais humano, mais aberto, e isso não tinha como ser ignorado.
Ricardo abaixou os olhos por um instante, como se estivesse ouvindo algo que nunca ninguém tinha tido coragem de dizer. Eu segurei a mão dele e senti sua respiração mais pesada, como se fosse difícil carregar a própria vulnerabilidade.
Carina continuou. Disse que, quando me viu perder o controle, também me enxergou como mulher. E que, se fosse ela no meu lugar, talvez tivesse agido pior. Sorriu de leve, pela primeira vez, e completou que a raiva é a irmã mais próxima do amor, porque só reage assim quem realmente sente.
Meu peito se apertou. A sensação era de que uma barreira começava a ruir. Estendi minha mão na direção dela, hesitante, mas sincera. Carina olhou para minha mão por alguns segundos, depois para Ricardo, e por fim segurou. Não havia calor imediato, mas havia aceitação.
Ricardo ergueu os olhos e nos observou, como se estivesse vendo algo impossível acontecer diante dele. Sorriu de leve, quase em alívio, e disse que talvez aquele fosse o maior presente que poderia receber: duas mulheres fortes, tão diferentes e tão parecidas, finalmente se entendendo.
Carina riu baixo e soltou minha mão com delicadeza. Disse que não éramos amigas ainda, mas que havia um respeito novo nascendo ali. E que, se fosse para seguir em frente, seria desse jeito, sem máscaras, sem rancores.
Eu concordei, sentindo o peso nos ombros diminuir. Ricardo entrelaçou nossas mãos, a minha de um lado e a de Carina do outro, como se quisesse selar de vez aquele pacto inesperado. E naquele instante, percebi que o vínculo tinha nascido: não perfeito, não fácil, mas real.
O café voltou a ser apenas um café. Mas para nós três, aquele dia marcava um novo começo.
Os dias que seguiram depois do encontro no café foram diferentes. Não havia declarações grandiosas nem promessas formais, mas uma mudança sutil se instalara entre mim e Carina. Onde antes havia tensão e desconfiança, agora surgia um espaço para respeito, e aos poucos, para algo que se parecia com proximidade.
Na primeira vez que nos vimos depois, ela apareceu em casa para trazer algumas coisas do interior. Eu a recebi com cuidado, ainda temendo um clima pesado, mas para minha surpresa ela me cumprimentou com naturalidade. Não havia afeto exagerado, mas também não havia a frieza de antes. Conversamos sobre trivialidades — o trânsito, o calor da cidade, até sobre receitas que ela aprendeu com a tia. Era simples, mas foi o suficiente para perceber que a porta estava aberta.
Ricardo assistia a tudo em silêncio, como se tivesse medo de quebrar o feitiço. Eu via nos olhos dele a gratidão por não precisar escolher entre nós duas, por não carregar mais o peso do conflito. Em alguns momentos, quando nossas conversas fluíam leves, ele sorria de canto, um sorriso discreto de alívio.
Com o tempo, Carina começou a se permitir pequenas confidências. Comentou certa noite que havia notado como Ricardo estava diferente. Disse que antes ele era duro, impaciente, fechado, mas que agora conseguia ver nele um homem mais carinhoso e até mais leve. E reconheceu que isso vinha de mim. Suas palavras não foram ditas como elogio, mas como constatação.
Aquilo me tocou de uma forma inesperada. Percebi que, de certa maneira, Carina não me olhava mais apenas como a mulher que a feriu, mas como alguém que, por um caminho torto, havia despertado no irmão dela algo que ela mesma sempre quis.
Ricardo, ao ouvir isso, ficou em silêncio, mas seu olhar denunciava tudo. Ele sabia que aquelas palavras de Carina eram mais do que um reconhecimento — eram um passo em direção a um vínculo que ninguém imaginava possível.
No dia a dia, as marcas do passado ainda estavam lá, mas já não sangravam. Havia brincadeiras tímidas, uma cumplicidade que surgia aos poucos, e até risos compartilhados em situações banais. Eu sabia que não era amizade ainda, mas havia respeito. E onde há respeito, o resto pode florescer.
Naquele ciclo novo, percebi algo importante: não era só sobre eu e Carina. Era sobre Ricardo também. Pela primeira vez, ele podia ser apenas ele mesmo, sem o medo constante de um confronto entre as duas mulheres mais próximas da sua vida.
E esse era o verdadeiro reflexo do vínculo: não apenas a paz entre nós, mas a transformação silenciosa de Ricardo, agora livre para ser inteiro.
Alguns dias depois do café, Carina voltou a aparecer. Não foi planejado, nem para resolver nada — apenas veio deixar umas coisas do interior e acabou ficando para o jantar. A atmosfera já não era de tensão. Era simples, quase natural, como se a ferida tivesse deixado de ser centro para dar lugar a um convívio novo.
Durante a sobremesa, Carina me olhou de repente e soltou algo que me pegou desprevenida. Disse que tinha reparado em Ricardo. Contou que, desde sempre, ele fora seco demais, prático ao ponto de parecer frio. E que pela primeira vez ela via nele um homem capaz de expressar afeto. Não falou como cobrança, mas como constatação.
Virou-se para mim e completou, direta. Você conseguiu o que eu nunca consegui. Ele mudou por você.
Não era repetição do que já tinha dito antes — dessa vez havia ternura no tom, como se ela mesma estivesse se rendendo a um fato. Eu sorri sem graça, tentando encontrar palavras, mas Carina não esperou resposta. Apenas segurou minha mão por um instante e disse que entendia. Como mulher, sabia o que era deixar o orgulho falar mais alto quando nos sentimos traídas ou ameaçadas. E acrescentou que, se estivesse no meu lugar, talvez tivesse feito pior.
Ricardo permaneceu em silêncio, mas seu olhar denunciava tudo. Ele parecia ouvir aquilo como quem recebe um presente inesperado. Quando Carina terminou de falar, ele apenas respirou fundo, ergueu o olhar para nós duas e sorriu com simplicidade. Pela primeira vez em muito tempo, parecia em paz.
Naquela noite, quando Carina foi embora, Ricardo me puxou para perto. Disse que, ver nós duas conversando daquele jeito, era como sentir um peso sair de seus ombros. Não precisava mais viver dividido entre duas forças que amava.
E eu percebi, com clareza, que aquele laço inesperado já não era apenas reconciliação. Era o início de algo que unia não só eu e Carina, mas também ele, no meio de nós duas, como elo.
Era uma noite comum, mas havia algo diferente no ar. Ricardo tinha feito questão de preparar o jantar, e Carina apareceu sem avisar, trazendo um bolo simples que havia comprado na volta do trabalho. Não havia cerimônia, apenas uma naturalidade que antes parecia impossível.
Sentamos à mesa os três juntos. Não houve grandes discursos, nem confissões dramáticas. Mas os olhares diziam mais do que qualquer palavra. Eu percebia em Carina um respeito novo, e em Ricardo, o alívio de quem finalmente podia respirar sem medo de um confronto.
Depois do jantar, ficamos na sala. O bolo quase intacto sobre a mesa, as taças de vinho esquecidas pela metade. Foi ali que o silêncio caiu, não o silêncio pesado de antes, mas um silêncio cúmplice, cheio de significados.
Carina se levantou primeiro e, quase sem jeito, colocou a mão no ombro de Ricardo. Disse apenas que estava feliz por ver o irmão daquele jeito, mais inteiro, mais humano. Depois olhou para mim e completou que sabia que parte disso vinha de mim. Não precisou dizer mais nada.
Ricardo segurou minha mão e a dela ao mesmo tempo, entrelaçando nossos dedos. Não foi um gesto ensaiado, apenas instintivo. Ficamos assim por alguns segundos, em silêncio, como se fosse um pacto não dito. Não havia promessas, não havia exigências, apenas a certeza de que dali em diante os vínculos seriam outros.
Carina se despediu logo depois, deixando-nos com a sensação de que algo havia se fechado e, ao mesmo tempo, começado. Quando a porta se fechou atrás dela, Ricardo me puxou para perto, encostou a testa na minha e sussurrou que nunca tinha sentido tanta paz em sua própria casa.
Naquele instante, entendi que Carina deixaria de ser um fantasma entre nós. O que precisava ser dito já tinha sido dito. O que precisava ser curado já estava em cicatrização.
Meses se passaram desde o encontro com Carina. As feridas ficaram para trás e a vida seguiu seu curso, mas não da maneira simples que eu gostaria.
Rubens continuava sendo meu marido. Suas viagens de negócios o mantinham distante durante longos períodos, mas sempre havia o retorno. Quando chegava, a casa mudava de ritmo: jantares bem servidos, conversas sobre o escritório, a segurança de uma vida organizada. Eu o amava, mas de um jeito sereno, quase institucional. Um amor que se confundia com respeito, com história compartilhada, com a sensação de dever cumprido.
Ricardo era o oposto. Com ele não havia serenidade, havia fogo. Não havia convenções, havia pele, cumplicidade e segredos. Ele não ocupava a posição de marido, mas o espaço de amante, confidente e homem que me transformava a cada gesto.
A cidade parecia ideal para esconder esse duplo universo. Entre os vidros escuros do carro, Ricardo e eu vivíamos momentos roubados. Em cada viagem curta, em cada trajeto comum, criávamos um refúgio invisível. Mas quando a porta de casa se abria, era Rubens quem me esperava, com sua presença sólida, sua voz grave e sua forma de amor que, apesar de diferente, também era verdadeira.
Eu vivia entre dois mundos. De um lado, o matrimônio com Rubens, estável, respeitável, com raízes profundas. De outro, o arrebatamento com Ricardo, visceral, intenso, proibido. Não havia como comparar, porque eram amores de naturezas diferentes. Eu não enganava a mim mesma: amava os dois, mas de formas que nunca se encontrariam.
Esse salto no tempo não me trouxe respostas. Apenas reforçou o dilema. O coração dividido entre a paz de Rubens e o fogo de Ricardo, sabendo que, cedo ou tarde, a cidade, com seus olhos atentos e sua boca cheia de segredos, poderia transformar meu equilíbrio frágil em ruínas.
Rubens havia voltado de viagem. O jantar em casa foi tranquilo, cheio de conversas sobre negócios, lembranças de amigos em comum e as novidades que ele trazia da Europa. Sua presença mudava o ritmo da casa, dava-lhe ordem e formalidade. Tudo parecia no lugar.
Mas naquela noite, quando nos recolhemos ao quarto, o clima ganhou outro tom. Ele se aproximou com a segurança habitual, segurando meu rosto entre as mãos e me beijando como quem cumpre um gesto familiar. Seus movimentos eram firmes, mas contidos, sem a urgência da paixão. Havia desejo, sim, mas moldado pela rotina.
Quando me deitou na cama, a sequência foi quase metódica. As carícias vinham nos pontos certos, mas faltava a intensidade que incendeia. Seus beijos eram corretos, medidos. Sua respiração, controlada. Rubens fazia amor com a mesma disciplina com que fechava contratos ou relatava suas viagens: direto, objetivo, sem se perder no abandono.
Quando me penetrou, o ritmo era constante, firme, mas sem explosões. Eu sentia seu corpo sobre o meu, mas não sentia sua alma. Ele se movia em mim como quem sabia de cor o caminho, mas não ousava sair da trilha. Era sexo, não entrega.
E foi nesse contraste que minha mente fugiu. Cada toque frio me lembrava do fogo de Ricardo, da fome nos olhos dele, da forma como me despia não apenas das roupas, mas de todas as minhas defesas. Eu estava ali com Rubens, mas por dentro ardia por outro.
No ápice, Rubens gemeu baixo, um som contido, e logo se afastou, virando-se para o lado. O sono o levou rápido, como sempre. Para ele, era o fim do ritual. Para mim, era o começo de um vazio.
Fiquei deitada, o corpo desperto, os olhos abertos no escuro. O amor que eu sentia por Rubens era real, mas sereno, quase institucional. Já o fogo que me queimava por dentro vinha de outro homem. E essa diferença me corroía.
Na manhã seguinte, a rotina voltou a se impor. Rubens tomou o café falando sobre reuniões, contratos e prazos. Eu o escutava, fingindo calma, mas ainda carregava no corpo o vazio da noite anterior. O sexo havia sido correto, firme, mas frio. O marido ao meu lado era o mesmo de sempre: sólido, previsível, distante na intimidade.
Quando terminou o café, ajeitou a gravata e me beijou na testa. Ao sair, encontrou Ricardo já à espera, de uniforme impecável. Era sempre assim: motorista, segurança, sombra discreta. Abriu a porta do carro para Rubens com a compostura profissional de quem não pode revelar nada. Eu observava da janela, e por um instante nossos olhos se cruzaram. Foi rápido, quase imperceptível, mas suficiente para acender o fogo que eu tentava apagar.
Horas depois, no início da tarde, a rotina trouxe Ricardo de volta sozinho. Ele entrou em casa com a mesma formalidade de sempre, pronto para se colocar à disposição, como fazia nos dias em que Rubens ficava no escritório até tarde. Mas bastou o silêncio da casa nos envolver para que o papel se desfizesse.
Ficamos frente a frente na sala. Não houve palavras, apenas a tensão que nos cercava desde a noite anterior. Eu ainda sentia no corpo a frieza de Rubens, e era impossível não buscar o oposto em Ricardo. Ele percebeu. Seus passos foram firmes, e quando me puxou contra o peito, o beijo veio urgente, faminto, como se ele também tivesse passado a noite inteira imaginando aquele instante.
A diferença era brutal. Onde Rubens havia sido contido, Ricardo era voraz. Onde o marido cumpria o ato como um dever, o amante se entregava como se fosse a última vez. Seu corpo me apertava, suas mãos percorriam minha pele sem cerimônia, e cada gesto me lembrava por que eu não conseguia resistir.
Naquele abraço, naquelas bocas que se devoravam no silêncio da casa, compreendi mais uma vez a linha perigosa em que eu caminhava. Ricardo servia a Rubens como empregado, mas a mim como homem. E eu, entre um e outro, oscilava entre dois amores de naturezas diferentes: o estável e o arrebatador.
A porta se fechou atrás de Ricardo e a casa mergulhou em silêncio. Ele retirou o paletó, afrouxou o colarinho e me olhou de um jeito que já dizia tudo. Não havia patrão, não havia regras. Só havia o homem que me consumia.
Em segundos estava sobre mim, a boca colada à minha, a língua dominando com voracidade. Me ergueu pela cintura e me prendeu contra a parede. Suas mãos subiam pelas minhas coxas, firmes, quentes, abrindo caminho até me despir às pressas, como se o tecido fosse um inimigo entre nós.
Me virou de frente para o sofá e me inclinou, segurando minha cintura com força. Quando seu pênis me preencheu, um gemido agudo escapou da minha garganta. O impacto me atravessou inteira, cada estocada mais profunda, mais brutal. Eu agarrava o estofado com os dedos, tentando suportar o ritmo insaciável que ele imprimia.
Ricardo gemia baixo, rouco, sua respiração contra a minha nuca me fazia perder o fôlego. Seus quadris batiam com violência contra os meus, e a cada investida o prazer crescia em ondas que me faziam tremer sem controle. Ele me puxava para trás, colando meu corpo ao dele, como se quisesse fundir nossas peles.
Me virou de repente, jogando-me de costas no sofá. Sua boca tomou meus seios, chupando e mordendo até eu gritar seu nome. Suas mãos seguravam minhas pernas abertas e me penetrava com força, mergulhando em minha vagina até que o sofá rangia sob nossos corpos. O prazer era cru, voraz, sem intervalos.
Quando ele parou de repente e segurou meu rosto com firmeza, entendi sem que fosse preciso palavras. Me ajoelhei diante dele, levando seu pênis à boca. Comecei devagar, lambendo, sugando com ritmo, até sentir suas mãos firmes nos meus cabelos, guiando cada movimento. Eu o chupava com fome e devoção, gemendo contra ele, sentindo-o pulsar cada vez mais.
O gemido grave escapou de sua garganta quando não resistiu mais. Ricardo derramou seu néctar quente em minha boca, forte, abundante, escorrendo pelos cantos. Engoli tudo, sentindo o gosto dele me marcar por dentro, e ainda lambi os lábios, olhando em seus olhos, mostrando que nada se perdia.
Mas ele não parou. Me puxou para cima, beijou minha boca molhada pelo seu próprio sabor e voltou a me tomar no sofá, dessa vez ainda mais intenso, mais brutal, como se o gozo anterior tivesse apenas incendiado ainda mais sua fome.
Quando me virou de costas e deslizou até meu ânus, o grito foi inevitável — primeiro de choque, depois de prazer absoluto. Suas estocadas eram profundas, me atravessando como trovões. Eu gemia alto, soluçava de prazer, meu corpo convulsionava até perder as forças.
Ricardo explodiu comigo, enterrando-se fundo, me enchendo com seu calor, marcando cada parte de mim. Desabei exausta em seus braços, e ele me estreitou contra o peito, cobrindo meu rosto de beijos.
Naquela tarde, não existia cidade, nem rotina, nem segredos. Só existia a entrega brutal, o pacto silencioso entre nós dois.
Rubens permaneceu apenas alguns dias em casa. O suficiente para restabelecer a ordem, retomar compromissos e marcar presença no círculo social. Suas conversas giravam em torno de contratos, prazos e jantares de negócios. Dormimos juntos, compartilhamos a cama, mas eu sabia que seu corpo já estava de partida, como sempre esteve.
Quando chegou a manhã da viagem, o ritual foi o mesmo de sempre. A mala já pronta, a gravata alinhada, o beijo de despedida na testa. Ele me olhou com ternura, mas era uma ternura distante, quase automática. Prometeu ligar assim que pousasse, deixou instruções sobre contas e compromissos e desceu as escadas.
Ricardo já o aguardava, uniforme impecável, postura firme. Abriu a porta do carro com a compostura profissional de sempre. Vi os dois se afastarem juntos e, pouco depois, a rua voltou ao silêncio.
Fiquei diante da janela, observando até o carro desaparecer na curva. Meu coração estava calmo, mas por dentro, em brasas. A ausência de Rubens não deixava vazio, mas criava espaço. Espaço para o outro, para o homem que, mais do que segurança, era meu guardião e minha perdição.
Quando Ricardo voltou sozinho no fim da tarde, a casa já não parecia um lar — era um território só nosso. O olhar dele dizia o que viria, e eu já não precisava esconder nada. Com Rubens longe, o tempo era nosso aliado.
Naquele instante, tive a certeza de que cada viagem de Rubens não era apenas rotina de trabalho. Era a senha para que eu e Ricardo pudéssemos viver sem máscaras.
Assim que Ricardo voltou sozinho do escritório e fechou a porta, não houve espaço para palavras. O silêncio da casa virou fogo. Ele me encostou contra a parede e me beijou com selvageria, a boca devorando a minha como se tivesse esperado séculos. Suas mãos apertavam minha cintura com força, subiam até meus seios e os massageavam como posse, arrancando de mim gemidos já no início.
Arranquei sua camisa com pressa e lambi seu peito suado, saboreando cada músculo tenso. Desci até abrir o zíper da calça e libertar o pênis latejante que pulsava contra meus dedos. Levei-o à boca, sugando fundo, faminta, até as lágrimas escorrerem dos meus olhos. Ricardo gemeu rouco, segurando minha cabeça com firmeza, guiando o ritmo até que eu engolisse cada centímetro dele.
Num gesto bruto, me ergueu no colo e me jogou no sofá. Rasgou minha roupa com impaciência, espalhando beijos e mordidas por todo o meu corpo. Quando sua boca alcançou minha vagina, foi devoção e selvageria ao mesmo tempo. A língua mergulhava fundo, sugava meu clitóris sem piedade, até que minhas pernas tremeram e o primeiro orgasmo explodiu em gritos abafados.
Ele não me deu tempo de respirar. Subiu sobre mim e me penetrou de uma vez, fundo, fazendo meu corpo arquear em choque e prazer. O ritmo era brutal, cada estocada batendo contra o fundo de mim. Eu arranhava suas costas, mordia seu ombro, e ele só acelerava, me possuindo como fera.
Me virou de bruços, puxou meus cabelos e me tomou por trás, entrando ainda mais fundo. O sofá rangia, meu corpo tremia, e outro orgasmo veio sem controle, me deixando desfalecida sob o domínio dele.
Quando me virou de frente outra vez, gozou sobre meus seios, marcando minha pele com seu esperma quente. Massageou com as mãos, espalhando o líquido sobre meus mamilos até me ver gemer de prazer. Depois me puxou de volta ao chão, e quando levei seu pênis à boca novamente, ele se derramou mais uma vez, jorrando dentro de mim. Engoli tudo, saboreando cada gota, olhando em seus olhos como quem sela pacto.
Mas ainda não havia acabado. Ricardo abriu minhas pernas de novo e me penetrou alternando entre minha vagina e meu ânus. Quando entrou por trás, um grito escapou da minha garganta, primeiro de choque, depois de prazer absoluto. Cada investida era profunda, elétrica, me fazendo chorar de prazer. Me senti em transe, dominada, conduzida a um lugar secreto onde só ele tinha a chave.
Ele me ergueu no colo, ainda enterrado em mim, e me girou pela sala, beijando minha boca com violência, até me lançar de novo no sofá. Terminou me tomando inteira, profundo, até explodir dentro de mim, me preenchendo por completo.
Caímos exaustos, grudados, o corpo suado e marcado. Ricardo me puxou contra o peito, acariciou meus cabelos e murmurou rouco no meu ouvido:
— Você é o meu incêndio, Viviane.
Adormeci com a perna jogada sobre ele, respirando o mesmo ar, selada pelo fogo da nossa entrega.

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Comentários


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farmaceutico- Comentou em 11/09/2025

O que foi esse texto? Inicio carregado de emoções e sentimentos, e um final excelente gostoso, romântico, avassalador, um texto em um site de milhões de putaria, você consegue nos prender em um texto desse. Parabéns Vivi.




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Ficha do conto

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Nome do conto:
A Cidade (Conversas Pendentes)

Codigo do conto:
242179

Categoria:
Traição/Corno

Data da Publicação:
11/09/2025

Quant.de Votos:
5

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