Eu e Bruna sempre nos falávamos um pouco antes de entrar na escola, ela chegava uns 15, 20 minutos antes porque seu pai passava por lá antes do serviço. Nesse dia, nada feito. Além de tudo, recebeu carona pra ir e pra voltar.
- Oi amor, desculpa, mas é que meu pai está num projeto enorme e o Tarley vai me levar e buscar todos os dias pelas próximas duas semanas.
Senti aquilo como flechada. Como assim? Além de receber carona do pai do ex dela, que vivia falando com ela pelos cantos sem eu saber os assuntos, agora era a vez de ter caronas?
- Tudo bem Bru.
Desesperançoso, me dirigi ao interior da escola depois de um selinho bem sem gracinha. Nem eu estava tão entusiasmado, ela pareceu se importar, mas não quis falar nada. Entramos juntos na sala e eu tentava fazer o que ela tinha pedido. Ignorar Jorge. E fazia isso para não partir pra agressão. Seja lá o que for, que se dane.
Então passei a estudar mais. Bruna sempre ia pra um cursinho a tarde, coisa que eu não conseguia pagar e nem minha família. Ela queria passar em uma federal e tinha muita capacidade pra isso.
Com o tempo, descobri que ela queria fazer uma universidade privada, porque Jorge pretendia faze-la e ela viu que era uma ótima oportunidade por ser uma das melhores do Brasil. É claro que ele tentaria uma particular, nunca teria capacidade de passar em qualquer pública.
Bruna chegou a me perguntar se não conseguiria ir pra particular, estudar perto dela. Minha resposta foi:
- Só com bolsa de estudos. Impossível pagar uma.
Ela riu e ficava curtindo com minha cara por não ter a mesma condição financeira. Mas depois falou que se passasse na particular, que ela pediria para o pai dela ajudar nas despesas. Na hora aceitei, mas é claro que não queria algo assim.
À medida que os dias iam passando, Jorge também ia tendo mais tempo de atenção dela na escola. Num determinado momento eles se falavam, riam e se divertiam muito mais tempo que eu e ela. Percebendo que eles se mereciam por ter mesma condição e, agora, muito mais química que eu e ela, passei a também ignora-la um pouco dizendo que era por conta do foco nos estudos. Queria uma federal e dane-se ela.
Mas Bruna, doce e esperta como sempre. Pareceu perceber minha mágoa sem eu falar a respeito. Como uma mágica, passou a ficar mais perto de mim e retomou nosso lance de antes. Jorge passou a ser ignorado por ela na escola aos poucos.
Em três semanas era só eu e ela. Juras de amor, promessas de uma vida juntos e tudo mais. Voltei a estar confiante e radiante.
Uma semana antes dos vestibulares, um professor, o mesmo que tinha se preocupado em eu e ela estar namorando, organizou um aulão específico e é claro que topamos ir junto com dezenas de alunos. Jorge não foi, ele não se dava bem com esse professor.
Passamos a manhã e a tarde de um sábado estudando. Almoçamos na escola e nesse momento o professor ficou perto de Bruna, conversaram bastante, mas devido ao barulho, pouco entendi. Parecia que ele queria orientar ela durante a semana. Ela inicialmente não queria, mas ele falou algo que não entendi e ela mudou de ideia.
Ao final da aula, o professor a convidou para estudar com ele na biblioteca. Quis ir também, mas ele falou que era uma orientação direcionada, que depois faria com todos os demais. Embora ele não tivesse avisado a todo mundo. Bruna me tranquilizou e disse que tudo bem. Mandou eu ir embora pra casa e assim o fiz.
Durante toda a semana, o professor se encontrava com Bruna na biblioteca, sempre a sós. Ela nunca contava muitos detalhes, dizia ser estudo. Mas depois, o professor também me chamou. A diferença é que nos falamos por 10 minutos e ele terminou. Não tinha mais ninguém pra ir lá depois disso.
- Bru, esses estudos são bem esquisitos. Porque contigo durava 20, 30, 40 minutos e comigo foi só dez?
- Ué amor, às vezes porque ele acredita que tá mais avançado que eu no estudo. Não é nada demais, amor.
As provas vieram, primeiro da federal. Eu e Bruna fizemos a avaliação em locais diferentes. Me senti muito confiante. Terminei e fui pra casa dela, queria fazer uma surpresa e corrigir a prova juntos.
Mas, ao chegar, vi que a Dodge de Tarley estava por lá. Toquei a campainha e depois de um bom tempo, ouvi a voz dela perguntando quem era. A voz era de quem estava cansada e com preguiça.
- Sou eu, Bru. Vim pra corrigir a prova juntos.
Ao ouvir minha voz, a reação dela foi enérgica. Primeiro pediu pra esperar, depois falou que era melhor retornar outro dia até que, levantando suspeitas a cada instante, o portão de sua casa abriu. Eram seus pais chegando da rua.
- Cacete! - ouvi ela falar.
Sem entender nada eu só esperei os pais dela entrarem. Me cumprimentaram amistosamente, nem pareciam os sogros da primeira noite que fui lá. Tati, a mãe de Bruna, me convidou pra entrar e assim o fiz. Perguntou sobre o que fazia por lá e falei da prova.
- Que genro fofo! Tomara que tenha tido um ótimo resultado, estarei na torcida. Vou chamar a Bruna pra vocês conversarem sobre a prova.
Fiquei na sala acompanhado de Dante. Perguntou sobre a prova também e ficou ali me distraindo por uns minutos. Depois de um bom tempo, Bruna apareceu, meio desajeitada e descabelada.
- Oi amor. Como foi de prova?
- Fui bem Bru, e você?
- Acredita que passei mal e não fui?
- Sério? Estava tão confiante pouco antes da prova na ligação.
- Pois é, tive uma baixa de pressão. Fiquei malzona e não fui. Meus pais não estavam aqui e então eu tomei uns remédios. Agora tô melhor.
- E porque não me chamou?
- E atrapalhar sua prova também? Não, chamei o Jorge, tava aqui mais perto e ele veio ajudar.
Na hora fiquei desconfiado demais.
- O Jorge?
- Não é nada demais, amor. E ele nem ia fazer a prova. Ele ficou aqui durante toda a tarde.
- Que garoto de ouro! - falou Dante se metendo.
- E onde ele tá?
- Tá no banheiro, limpando. Eu vomitei.
Instantes depois, sem um pingo de indícios que tivesse mexendo com limpeza, Jorge aparece. Cumprimenta Tati e depois Dante. O pai de Bruna o agradece e praticamente o festeja por ter ido ajudar a filha.
- Obrigado, Jorge - respondi escondendo a real sensação de trouxa que sentia.
- Precisando, é só chamar. Eu vou indo nessa. Preciso ajudar meu pai.
Do mesmo modo que veio, desapareceu. Queria ficar um pouco com ela em seu quarto. Insisti e recebi como resposta um:
- Pode ir embora, amor. Eu tô bem, você está cansado. Meus pais estão aqui, se eu sentir mal me ajudam.
Percebi que sobrava ali. Nem Dante e nem Tati insistiram pela minha presença. Mas antes de ir, pedi pra ir ao banheiro e me direcionei ao mais próximo de seu quarto. Ela praticamente me perseguiu se assustando com minha reação abrupta.
Ao passar pelo seu quarto, a porta estava entreaberta e vi algumas peças de roupa jogadas além de parte da cama totalmente bagunçada. No banheiro, nenhum sinal de limpeza recente. Tava claro que a conta não fechava.
Mas a doce Bruna estava me traindo com seu ex? Não podia ser. Agradeci o uso do banheiro e fui embora sério desejando melhoras. Ela tentou argumentar algo, mas eu francamente nem prestei atenção. Nem cumprimentei direito seus pais.
Parecia que estava em outro mundo. Nada fazia sentido pra mim. Chorei, me magoei e queria esquecer a doce Bruna. Tarefa praticamente impossível. Ela ainda me ligou mais tarde perguntando se tinha corrigido a prova, demonstrou interesse em mim, pediu desculpas por ter chamado Jorge. Por um instante parecia que ia confirmar minha suspeitas e confessar, mas respirou fundo, disse que me amava muito e que gostava de ter um namorado tão carinhoso, companheiro, amigo e compreensível.
- Não é nada demais, amor!
Será?
Continua...