A fachada ostentava azulejos brancos e pretos que perderam o brilho há décadas, e sobre eles, um letreiro neon vermelho, com letras cursivas que piscavam uma falha charmosa: "B-A-RBADA".
Ao cruzar a porta pesada de madeira maciça, o cliente era recebido pela principal artéria do lugar: o balcão de madeira escura e maciça, talvez mogno, com entalhes simples nas laterais. O tampo, polido pelo tempo e pelos cotovelos de inúmeros boêmios, refletia as luzes amareladas das três luminárias industriais de metal penduradas sobre ele. Pendurados sobre a prateleira de espelhos, copos e taças reluziam, perfeitamente alinhados. No canto, perto da escada que levava ao depósito, uma prateleira especial guardava a coleção de chapéus Panamá de Paulo, todos em tons de bege e branco, cada um com uma fita diferente, dependendo do humor do dia.
O cheiro era uma mistura inconfundível: o toque ácido e rústico da cachaça artesanal armazenada nos tonéis de vidro, o café coado desde as cinco da manhã e a doçura do bolinho de chuva feito por Dona Nena, a cozinheira, cujo aroma pairava como uma névoa nostálgica. Contra a parede, como uma guardiã silenciosa das memórias, estava a Jukebox Wurlitzer, imponente e vermelha. Ela era a regra de ouro do Barbada: só tocava música brasileira, escolhida a dedo e mantida por um apaixonado Paulo.
Paulo Guilherme, 40 anos, era a personificação da elegância em meio ao caos controlado. Sua marca registrada não era um uniforme, mas o cuidado com que se vestia. Naquela manhã, ele usava uma camisa de linho azul-clara, calças sociais de corte perfeito e, claro, um dos seus Panamás, o de fita verde-escura, que dava um toque de galã antigo. Sua postura, controlada e cerimonial ao servir, dava a impressão de que ele era o centro de gravidade do lugar. Seu traço mais marcante era a concentração atenta no olhar – ele não apenas ouvia os clientes; ele os processava.
Ao lado dele no balcão estava Rosângela, a gerente do Barbada. Ela era o motor pragmático que garantia que o idealismo de Paulo se traduzisse em lucro. Rosângela era mais jovem e rápida, vestindo sempre blusas de cores fortes e vibrantes, e era a única pessoa que conseguia fazer Paulo tirar os olhos do balcão para checar os números.
— Paulo, o estoque de cerveja precisa ser fechado antes do almoço. — A voz dela era prática, sem margem para poesia. — Já está na lista, Rosa. Mas, primeiro, a conversa! — Ele respondeu, com um sorriso de quem sabe exatamente qual é a verdadeira prioridade.
O sol das dez da manhã entrava pela janela frontal, iluminando a poeira dançante, enquanto a Jukebox murmurava um Cartola suave. Paulo estava imerso em seu ritual matinal favorito: a Arte da Conversa.
Ele serviu um café preto fumegante na xícara de porcelana grossa para Dona Lúcia, a cliente fiel que lia seu horóscopo na primeira mesa.
— Bom dia, Dona Lúcia. O que os astros dizem hoje? Espero que seja um dia de paz e sem confusão, como a gente gosta. — Bom dia, Paulo. Os astros dizem que hoje terei um encontro importante. — Ela abaixou o jornal e sorriu com os olhos. — Mas não é amoroso, não. É a primeira conversa do dia, a mais importante, com meu amigo dono de bar. — Ah, então já cumpri minha missão! — Paulo sorriu. Ele não conseguia simplesmente servir. Ele precisava engajar. Sabia o nome de cada frequentador, qual time torcia, o nome do cachorro, e o apelido de infância. O silêncio, para Paulo, era um tipo de fracasso profissional. Ele precisava garantir que o Barbada fosse um confessionário informal.
Seu olhar varreu o pequeno salão. Tudo estava no lugar, pronto para o dia. A música estava boa, o café estava forte, e ele já havia garantido o primeiro diálogo significativo do dia.
Tudo estava em perfeito e confortável equilíbrio.

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