E então, havia Lucas.
Lucas, o filho de Carlos, de um primeiro casamento. Com seus vinte e poucos anos, ele se mudara para a casa vazia "por um tempo", para cuidar da viúva jovem que o pai deixara. Era um gesto de bondade, mas para Clara, tornou-se uma tortura sutil.
Era nos pequenos gestos que o desejo se insinuava, traiçoeiro. Não era o Lucas que ela desejava, Clara repetia isso a si mesma até a exaustão. Era o eco de Carlos. O jeito como Lucas mexia o café, o mesmo movimento circular e preciso. A sombra do sorriso do pai que às vezes surgia em seus lábios. A estrutura óssea do rosto, tão familiar que doía.
Mas com o tempo, o eco começou a ganhar uma voz própria, um corpo próprio. Ela começou a notar as diferenças: a força nos braços de Lucas, mais jovem e vital que a do marido; o som da sua guitarra elétrica, que preenchia a casa com uma energia que Carlos nunca teve; o cheiro dele, não mais o amadeirado do aftershave do pai, mas algo fresco, suado e vivo.
A culpa era sua companheira constante. Um fogo sagrado que se apagara no leito matrimonial agora se reacendia como um incêndio profano diante do enteado. Ela se flagrava observando a nuca dele enquanto ele cozinhava, a curva de seus ombros sob a camiseta. Um aperto de mão ao passar o saleiro era um choque elétrico. Um "obrigada, Lucas" sussurrado saía mais rouco, mais carregado do que deveria.
O clímax veio numa noite quente e silenciosa. Clara desceu para beber água e o viu dormindo no sofá, a luz azulada da TV pintando seu rosto. Ele estava com um braço jogado para o lado, a mão aberta, palma para cima. Era um gesto de entrega, de inocência. E, naquela fração de segundo, um impulso primitivo e avassalador tomou conta dela. O desejo de cruzar a sala, de ajoelhar-se ao lado do sofá, de encostar os lábios não em sua boca, mas naquela palma aberta — um beijo de perdão, de adoração, de rendição.
Ela não se moveu.
Paralisada, sentiu o gosto amargo da traição — não do ato, mas da intenção. Estava traindo Carlos com seu próprio sangue, com seu próprio legado. Estava traindo a memória do marido com a carne viva do filho.
Na manhã seguinte, o silêncio na cozinha era mais espesso que o normal. Lucas preparava o café, alheio ao terremoto que havia sacudido a alma dela horas antes. Quando ele se virou para lhe entregar a xícara, seus dedos se encontraram. Desta vez, Clara retirou a mão como se tivesse tocado fogo.
— Preciso me mudar, Lucas — ela disse, a voz estranhamente firme. — Esta casa... está me fazendo mal.
Ele a olhou, confuso, um pouco magoado. — Eu posso ir embora, Clara. Você não precisa sair.
— Mas eu preciso — ela respondeu, e pela primeira vez, seus olhos encontraram os dele sem buscar Carlos neles. Encontrou um homem jovem, um estranho gentil. — É exatamente isso que eu preciso.
Naquela tarde, enquanto fazia as malas, ela finalmente tirou o casaco de Carlos do cabide. Dobrou-o com uma solenidade fúnebre e o guardou numa caixa. O perfume, por fim, começou a se dissipar. Ela não estava fugindo de Lucas. Estava fugindo do fantasma que havia criado, do desejo proibido que era, no fundo, apenas o último e mais desesperado suspiro de seu luto. Ela estava, finalmente, enterrando o marido.