"E como você se sente com tudo isso, Rita?" perguntou a mulher.
"Roubada", a resposta saiu dura, direta. "Me sinto roubada. Do meu negócio, do meu trabalho, do meu orgulho. Ele não levou só o dinheiro. Levou meus desenhos, o nome da minha família... a prova de que eu existi."
Do seu lado, uma mulher de ombros largos e postura militar — que tinha se apresentado como Jessi — soltou uma risada amarga.
"Pois é. Bem-vinda ao clube", Jessi disse, olhando para as próprias mãos. "Eu me sinto roubada da minha farda, da minha honra e do futuro da minha irmã. E o pior é descobrir que a justiça que você defendeu não existe. Ela tem preço, e é barato."
Um murmúrio de concordância ecoou na sala. Todas ali tinham uma história parecida.
Foi quando Bela, a mulher sempre calada do canto, falou. Ela vestia roupas simples, mas parecia ter saído de um escritório importante.
"Elas não nos roubaram", disse Bela, com uma voz firme que fez todas olharem. "Roubo é coisa de amador. O que fizeram conosco foi um negócio. Eles pegaram o que queriam e nos deram os restos, que chamam de 'consequências'. Foi frio. Foi de propósito."
Um silêncio pesado caiu na sala. A psicóloga ia falar, mas Rita a interrompeu. Seus olhos, cheios de uma luz súbita, se prenderam nos de Bela.
"E se..." sussurrou Rita, com uma voz que tremia de raiva e esperança. "E se a gente fizesse um negócio de volta? Um que eles não conseguissem colocar na planilha deles?"
Bela manteve o olhar firme. Um canto da sua boca subiu um milímetro. Não era um sorriso, era o reconhecimento de uma jogada.
A sessão acabou logo depois. As mulheres saíram, cada uma para a sua vida quebrada. Rita desceu até a calçada, o coração batendo forte. Ela sentiu alguém ao seu lado.
Era Jessi, acendendo um cigarro.
"Um negócio, hein?" Jessi falou, oferecendo o maço. Rita recusou. "Minha irmã precisa de um transplante. O plano de saúde não cobre. Dizem que é caro demais." Ela soltou a fumaça. "Eu já perdi tudo que importava. Não tenho mais medo."
Bela se aproximou sem fazer barulho.
"Todo mundo tem medo, Jessi. A questão é: o que você faria para pegar de volta o que é seu?" Ela virou para Rita. "Esse negócio. Tem um alvo?"
Rita engoliu seco. O peito doía, mas era um bom tipo de dor. A dor de quem vai fazer alguma coisa.
"Tem", ela confirmou, baixinho. "A Joalheria Valença. O banco vai leiloar tudo em quinze dias. Tudo que eu tenho está lá dentro. Os diamantes, o ouro... e os meus desenhos originais. Os que meu ex disse que eram dele. Estão no cofre."
Bela assentiu devagar, a mente trabalhando.
"Um cofre. Segurança. Acesso." Ela olhou para Jessi. "E você... entende de segurança. Sobre como burlar."
Jessi apagou o cigarro no chão.
"Entendo. E conheço gente que também foi queimada pelo sistema."
As três ficaram paradas na calçada, num silêncio que dizia tudo. Já não eram três estranhas. Eram um time.
"O meu apartamento é seguro", Bela disse, decidida. Era uma ordem. "Nenhuma de nós pode ser vista junta depois de hoje. Se vamos fazer isso, fazemos direito."
Rita sentiu um frio na espinha, mas também uma coragem nova. Ela olhou para Jessi. E, nesse momento, algo mudou. Jessi a fitou de volta, e não era só com a dureza de uma ex-PM. Havia um brilho diferente no fundo dos seus olhos castanhos, um interesse que ia além do plano. Era um toque de cumplicidade, de atração no meio do caos.
"Então tá combinado", disse Rita, sentindo o rosto esquentar. "Vamos fazer um negócio que eles vão lembrar pra sempre."
E naquela calçada simples, o trio nasceu. E entre Rita e Jessi, nasceu também uma faísca, pequena e perigosa, que prometia incendiar tudo.