No Escuro do Cinema



Aconteceu comigo. Em Braga. Sou um homem como tantos quarenta e nove anos, (42 anos quando se passou) carne habituada ao silêncio e ao hábito, mas com a alma inquieta como se os dias me pudessem explodir dentro do peito a qualquer momento. Conhecia o cinema porno do centro comercial desde miúdo, mas a memória guardava-o como ruína abafada. Duas visitas apenas, ambas antes dos vinte. Nada mais.
Numa dessas noites em que o jantar se mastiga em solidão e o café se torna pretexto para respirar fora de casa, decidi ir ao meu refúgio habitual, aquele centro comercial moribundo, onde o tempo parece estar sempre prestes a acabar. Sentei-me no café vazio, folheei jornais como quem finge não ter desejos a pulsar entre as pernas.
Olhei, como sempre, a entrada do cinema. Uma superstição, a ideia de que um dia um casal ali entraria, e que algo aconteceria. A esperança é um vício mais teimoso do que o prazer. Até que os vi. Ele e ela. Passaram por mim como se flutuassem numa tensão que se podia lamber no ar. O corpo dela moldava o vestido como se este tivesse sido criado pela língua de alguém, e os olhos dele percorriam-na como um animal que se domina apenas porque sabe que em breve a irá devorar.
Subiram. Eu segui-os, disfarçando a febre no corpo. Parei diante da loja que uso como espelho e esperei. Quando os vi entrar, soube — sem dúvida alguma — que o destino não tinha vindo brincar comigo. Comprei bilhete, entrei. A sala era um santuário escuro onde a luxúria se respira em silêncio. Vi-os a meio da sala. Sentei-me atrás, toquei-me por dentro das calças, o pau já duro, como se soubesse que aquela noite tinha nome e boca.
Eles murmuravam, espiavam a sala. As mãos insinuavam-se. Depois, levantaram-se. A princípio temi que fossem embora, mas não, subiram mais, para o topo da sala. E foi lá, sob a luz trémula do ecrã, que a boca dela se abriu como flor de fogo. Ele de pé, ela ajoelhada. Um quadro sacro de luxúria.
Mudei de lugar. Sentei-me mais perto. A masturbação era agora um acto de fé. Toquei-me com a precisão de quem reza, com a fome de quem há demasiado tempo só imagina.
Foi ele quem me chamou, com um gesto lento. Fui, pela fila da frente, sem dizer palavra. Parei diante deles. Os olhos dela cruzaram-se com os meus. Ela continuou a chupá-lo, lenta, profunda, com a boca a engolir e saborear como se cada veia daquele sexo fosse um poema maldito.
Toquei-lhe. Ela afastou-me. Era ela quem escolhia. Quem ditava. Mas minutos depois, a sua mão envolveu o meu pau, e masturbou-me com a perícia de quem conhece a alma de um homem pelo peso do seu prazer. E depois, oh Deus, a boca dela desceu sobre mim. Molhada. Quente. Exata. Como se cada movimento da língua fosse escrito na minha espinha.
Ela alternava entre nós dois, duas vergas duras na sua boca insaciável. Três outros homens, sombras na penumbra, aproximaram-se. A noite era dela, e ela sabia-o. Sem que ninguém tocasse no seu corpo, chupou-nos a todos com uma mestria que não se ensina. uma boca feita para destruir certezas, para nos fazer esquecer o nome.
Ela engolia cada gota. Ninguém saía ileso. Eu vim-me duas vezes na sua garganta. A primeira como quem morre num orgasmo absoluto. A segunda já ao cair do filme, com os outros regressados aos seus lugares, como se tivessem vivido um sonho sujo e sagrado.
Nunca trocámos uma palavra. Saí antes deles. Mas algo de mim ficou naquela sala, algo que talvez nunca volte.
E se este conto chegar até eles, a este casal que virou noite em carne viva, que saibam: sou todo gratidão. E desejo. Se houver vontade, se o acaso nos quiser cúmplices outra vez, estarei pronto. Com o mesmo silêncio, a mesma fome, a mesma entrega.

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Comentários


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biquinirosa Comentou em 20/07/2025

No cinema é uma delícia




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Ficha do conto

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lord-mindbinder

Nome do conto:
No Escuro do Cinema

Codigo do conto:
238604

Categoria:
Confissão

Data da Publicação:
19/07/2025

Quant.de Votos:
4

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0