Eles tinham 32 e 30 anos, e uma história feita de riso, pele e cumplicidade. Andréia sempre fora intensa na cama, de corpo desperto e alma inteira. Gostava do toque, da penetração, do calor do corpo dele sobre o seu. Era uma mulher que vivia o desejo sem culpa — e o amor que tinham só fazia isso florescer.
Mas agora havia a palavra “remoção”.
Antes da cirurgia, decidiram congelar um pouco do futuro — armazenaram o esperma de Renato, gesto que os uniu ainda mais. Foi um ato de esperança: a certeza de que, um dia, poderiam gerar juntos a vida que ainda não tinham.
Na véspera, ela o observava dormir. Tocou-lhe o rosto com cuidado e sentiu medo.
Não o medo da ausência dos testículos — mas do que aquilo poderia simbolizar para ele, para eles.
Temia que o homem que amava se perdesse dentro de um silêncio de vergonha.
A cirurgia correu bem. Renato acordou pálido, mas lúcido. Ela o beijou na testa e sorriu com os olhos marejados.
Nos dias seguintes, o corpo dele se recuperava, mas a alma parecia encolhida.
Renato falava pouco, evitava o espelho e, sobretudo, evitava a si mesmo. Andréia sentia-se dividida entre o amor e o desejo, entre o cuidado e a falta. Recusava a partilhar com o marido qualquer coisa a respeito disso e buscava no banho um toque em si mesma que lhe proporcionasse um pouco de prazer, tornando os dias mais suportáveis.
O desejo ainda vivia nela — não como urgência, mas como lembrança do que eram juntos.
Com o passar das semanas, o silêncio entre eles tornou-se denso. Era como se a vida sexual tivesse sido amputada do casamento embora a médica houvesse dito que, dentro de alguns meses, com o tratamento de reposição hormonal, Renato recuperaria a sua virilidade. Ela tinha esperanças e dúvidas também assim como ele.
Na terceira semana, ele a procurou, tentando retomar o que tinham.
Ela sentiu o coração acelerar — não apenas de vontade, mas de medo de feri-lo.
O encontro foi breve, hesitante. O corpo de Renato, porém, não respondeu como antes.
E ela, tomada por um misto de frustração e ternura, abraçou-o em silêncio. Quando foi se banhar, seu tesão foi momentaneamente apagado pela tristeza.
A partir daí, afastaram-se.
Andréia sentia saudade dele, mas também de si mesma — da mulher inteira que sempre fora ao seu lado. Por vezes chegou a pensar se o divórcio ou a traição não seriam soluções para si, mas amava o marido. Passava as noites em claro, recordando a força com que se desejavam, e chorava não pela falta do sexo, mas pela ausência daquele olhar em que sempre se reconhecera.
Foi numa dessas madrugadas que ela o procurou.
Sentou-se ao lado de Renato, que fingia dormir, e tocou-lhe o peito.
“Eu não quero o homem de antes”, sussurrou. “Eu quero você, agora.”
Ele a olhou, confuso e comovido. Então ela encostou o rosto no dele e o beijou, devagar, como quem pede para ser lembrada.
Nos dias que seguiram, não houve pressa.
Voltaram a se tocar com a delicadeza de quem aprende outro idioma.
Andréia descobriu que o prazer podia estar em gestos mínimos — no calor das mãos, no roçar dos corpos, no riso contido entre um toque e outro. Nos dedos do marido, ela gozou enquanto era beijada.
O desejo, que antes era fogo, tornou-se luz branda e constante, mais profunda e madura.
Ela percebeu que, ao invés de perder o amante, ganhara um novo modo de amar.
O corpo de Renato respondia de outro jeito — e o dela também.
O que antes era impulso tornou-se entrega.
A penetração deixou de ser o centro, e o prazer se espalhou por tudo: pelo olhar, pela pele, pelo simples estar juntos.
Com o passar dos meses, o amor amadureceu.
Renato voltou a sorrir, a brincar, a desejar.
A testosterona reposta devolvia-lhe a energia, mas era Andréia quem o fazia sentir vivo.
E, numa noite em que o vento trazia cheiro de chuva, o reencontro se deu.
Sem planos, sem medos, apenas o instante.
Os corpos se buscaram com naturalidade, como rios que reencontram o leito.
Enquanto introduzia em si o vibrador que Renato havia lhe dado para que usasse durante as relações, seu pênis ficou ereto, pronto para lhe dar prazer.
Andréia olhou para ele e viu o homem que amava — inteiro, humano, presente.
E compreendeu que o desejo verdadeiro não nasce dos instintos, mas da ternura.
Quando adormeceram, lado a lado, ela pensou que a cirurgia não lhes havia tirado nada essencial.
Pelo contrário — havia descascado o amor até o seu núcleo mais puro, onde o desejo e o afeto já não se distinguiam.
E, naquela noite, Andréia soube que, mesmo sem filhos ainda, eles tinham gerado algo maior: uma nova forma de amar — mais consciente, mais livre, mais verdadeira.

