Helena sentiu a mudança no minuto em que passou pela porta de vidro. As secretárias, que antes a cumprimentavam casualmente, agora davam sorrisos largos e cheios de bajulação. Os diretores mais velhos, que antes a ignoravam, agora paravam para perguntar se ela tinha "dormido bem".
Ela não era mais a "nova arquiteta". Ela era a "Mulher de Artur".
O luxo daquela noite, o poder de entrar no salão no braço de Artur, havia sido viciante. Mas aquela manhã, o champanhe de gala tinha virado vinagre na boca de Helena. Ela se sentia exposta e julgada.
Ela tentou mandar uma mensagem para Bruno. Helena: "Bruno, me desculpe por sábado. Aconteceu tudo muito rápido. Podemos conversar?" A resposta veio em três segundos: Bruno: "Não temos nada para conversar. Nos vemos na reunião do Parque."
O gelo era palpável.
A Reunião do Parque
A reunião era sobre o projeto do parque, mas todos sabiam que era um show.
Artur estava sentado à cabeceira, a mão pousada no ombro da cadeira de Helena. Ele sorria para ela a cada dois minutos.
Artur: — E, como a minha parceira aqui me lembrou no jantar, precisamos de soluções que surpreendam o mercado.
Helena sentiu o rosto esquentar. Todos sabiam que ele falava do jantar, não do trabalho.
Bruno entrou na sala atrasado.
O Bruno que entrou não era o mesmo garoto que chorava por sombras de árvores e desenhava em guardanapos. Ele estava com um terno escuro, a gravata perfeitamente alinhada e um maço de papéis nas mãos. Os olhos dele eram duas pedras de gelo.
Ele não olhou para o pai. Não olhou para Helena.
Bruno: Desculpem o atraso. Estava finalizando alguns dados financeiros que acho que merecem a atenção da diretoria antes de continuarmos.
Artur sorriu, orgulhoso. "Veja só, Helena. Meu filho finalmente está amadurecendo! Vamos lá, Bruno, o que você tem?"
Bruno caminhou até o centro da sala e bateu os papéis na mesa.
Bruno: Na última reunião, Helena propôs uma mudança estrutural no sistema de irrigação do projeto, optando por um modelo de captação de água pluvial.
Helena: (Tentando ser amigável) É uma solução sustentável e econômica a longo prazo, Bruno.
Bruno: (Ele a cortou, sem mudar a voz, como se falasse com um estranho) A longo prazo, sim. Mas a curto prazo, essa solução encarece a primeira fase da obra em 18%. E, como o senhor (ele olhou para o pai, não para Helena) sempre diz, o prazo e o custo são a nossa prioridade número um.
Ele estava usando as regras e o vocabulário do pai contra a ideia de Helena. Ele estava sendo implacável.
Bruno: Meu pai me ensinou que "idealismo" não paga contas. Portanto, sugiro que voltemos ao sistema de irrigação padrão e usemos o dinheiro extra para otimizar o paisagismo na área já aprovada.
Helena ficou chocada. Ele estava desmantelando sua principal ideia de forma fria, profissional e baseada exatamente no tipo de lógica que Artur defendia.
Helena: Bruno, você sabe que essa solução é menos eficiente...
Bruno: (Ele finalmente olhou para ela, e o olhar dela era cortante) Eu sei o que é eficiente, Helena. E o que é viável.
Artur riu alto e bateu palmas.
Artur: Isso aí, filho! Foi para isso que eu te treinei! Helena, me desculpe, mas Bruno tem razão. O cliente quer a solução mais rápida. Menos idealismo, mais resultado.
Artur não viu o ódio e a mágoa nos olhos do filho. Ele viu apenas a ambição que ele tanto queria.
Helena se encolheu na cadeira. Ela tinha escolhido o luxo, o poder e a segurança de Artur. Mas ao fazer isso, ela tinha quebrado Bruno e o transformado em uma arma fria e letal. E agora, essa arma estava apontada diretamente para o seu trabalho e, talvez, para a sua vida com o pai dele.
Ela sentiu o peso daquele novo Bruno. Ele não estava mais apaixonado. Ele estava em guerra. E ela era o alvo.