"Gostei do que vi. Discrição é fundamental para mim também. Hotel Ritz, Bar do saguão. Daqui a uma hora. R$ 1.500 pelo jantar e conversa. O resto... negociamos no quarto. Topa?"
Mil e quinhentos reais. Era metade do que ela ganhava em um mês inteiro de trabalho árduo na loja. Em uma noite. Clara sentiu o estômago revirar — uma mistura ácida de náusea e esperança. Se ela conseguisse negociar o "extra", poderia pagar quase metade do boleto de Lucas numa única noite.
Com os dedos trêmulos, ela digitou a resposta que mudaria sua vida: "Estarei lá."
Agora, a corrida contra o tempo. Clara trancou a porta do quarto. Ela precisava se montar, mas precisava sair de casa como Clara, a mãe.
Abriu o guarda-roupa e puxou um vestido preto de seda que ajustava-se ao corpo como uma segunda pele. O decote era profundo, realçando o colo que ela cuidara tão bem. O tecido frio contra a pele quente causou um choque térmico que a despertou. Vestiu-o. Olhou-se no espelho e viu uma estranha. "Vera" estava começando a aparecer.
Mas ela não podia sair assim. Por cima do vestido provocante, colocou um sobretudo bege, pesado e longo, abotoando-o até o pescoço. Prendeu o cabelo num coque severo, mas deixou os grampos fáceis de soltar. Na bolsa, jogou a maquiagem pesada, o perfume importado que guardava há anos e um par de saltos agulha que machucavam os pés, mas alongavam as pernas de forma irresistível.
Ao sair do quarto, deu de cara com Lucas na cozinha. O coração de Clara falhou uma batida. O menino estava com uma caneca de café na mão e olheiras profundas.
— Mãe? — Ele a olhou de cima a baixo, estranhando o sobretudo naquela hora da noite. — Vai sair? São quase dez da noite.
Clara forçou um sorriso. O primeiro de muitos sorrisos falsos que ela teria que dar. — Surgiu uma emergência na loja, filho. Inventário de última hora para a coleção nova. A dona prometeu pagar o dobro pelas horas extras. Sabe como precisamos desse dinheiro.
Lucas suspirou, culpado. — Mãe, você trabalha demais. Quando eu me formar, juro que você nunca mais vai precisar fazer isso.
A ironia da frase atingiu Clara como um soco. Ela se aproximou e beijou a testa do filho. O cheiro de "mãe" — sabão em pó e café — contrastava com o que ela estava prestes a fazer. — Eu sei, meu amor. É tudo por você. Não me espere acordado.
Ela saiu para a noite fria.
O trajeto de Uber até o Hotel Ritz foi um borrão. Clara olhava as luzes da cidade passarem pela janela, sentindo-se desconectada da realidade. Parecia que estava assistindo a um filme onde ela era a protagonista trágica.
Ao chegar no hotel, ela não entrou imediatamente. Foi até o banheiro do saguão.
Lá dentro, a transformação final aconteceu. Clara tirou o sobretudo pesado e o dobrou na bolsa. Soltou o cabelo, deixando as ondas castanhas caírem sobre os ombros nus. Passou o batom vermelho — um tom de carmim que parecia sangue arterial. Borrifou o perfume nos pulsos, atrás das orelhas e, num gesto de ousadia súbita, entre os seios.
Quando ela se olhou no espelho do banheiro luxuoso, Clara Aguiar havia desaparecido. A mulher que a encarava tinha olhos predadores, lábios úmidos e uma postura altiva. Era Vera.
Ela respirou fundo, tentando acalmar o tremor nas mãos. — É só um corpo — sussurrou para o reflexo. — É só um negócio.
Vera saiu do banheiro. O som dos seus saltos estalando no mármore do saguão atraiu olhares. Porteiros, hóspedes, homens de negócios. Ela sentiu o peso daqueles olhares, mas desta vez, não se encolheu. Ela os absorveu.
Entrou no bar. A luz era baixa, o piano tocava uma melodia suave. No canto, numa mesa reservada, um homem olhava o celular. Grisalho, terno alinhado, relógio caro no pulso. André.
Ele levantou os olhos quando ela se aproximou. A expressão dele mudou instantaneamente. A indiferença deu lugar a uma apreciação faminta. Ele se levantou, um gesto de cavalheirismo que mascarava a transação financeira que estava prestes a ocorrer.
— Vera? — perguntou ele, a voz rouca.
Clara sentiu um arrepio — não de medo, mas de antecipação. O palco estava montado. — Boa noite, André — disse ela, a voz aveludada, assumindo o papel. — Espero não ter feito você esperar muito.
Ele sorriu, e Clara viu desejo genuíno ali. — Por alguém como você, eu esperaria a noite toda.
Ela se sentou, cruzando as pernas devagar, deixando a fenda do vestido revelar apenas o suficiente para prender a respiração dele. O jogo havia começado, e não havia mais volta para casa.