Sobre a cama, havia o convite dourado do "Baile de Gala". No celular, uma mensagem de Bruno que tinha chegado há meia hora: "Tô guardando lugar pra gente perto da mesa de doces. A gravata tá me enforcando, socorro! Kkkk".
Helena olhou para o celular. Ela sentiu um aperto no coração. Bruno era doce, divertido, leve. Ele era a escolha certa para uma vida feliz e descomplicada.
Mas então ela olhou para o espelho.
Ela estava usando um vestido longo, azul-marinho, de seda. Era um vestido sério, elegante, caro. Não era um vestido para comer docinhos escondido no fundo do salão. Era um vestido de rainha.
Às 19:00 em ponto, o interfone tocou.
Porteiro: Dona Helena? O carro do Sr. Artur Sá está aqui.
Helena respirou fundo. Ela não respondeu a mensagem de Bruno. Ela pegou sua bolsa pequena, apagou a luz e desceu.
Lá embaixo, um sedã preto e brilhante a esperava. O motorista, de luvas brancas, abriu a porta traseira. Ao entrar naquele carro, Helena sabia que não estava apenas pegando uma carona. Ela estava fazendo uma escolha. Ela estava escolhendo o poder. Ela estava escolhendo o homem que a desafiava a ser grande.
No Salão de Festas...
O lugar parecia um palácio. Lustres de cristal gigantes, garçons servindo champanhe, música clássica tocando ao vivo.
Bruno estava encostado numa coluna, longe da entrada principal. Ele se sentia um pinguim naquela roupa de gala. Ele olhava para a porta a cada cinco segundos, ansioso. Ele já tinha planejado a noite toda: ele e Helena iam rir dos discursos chatos, depois ele ia convidá-la para comer um hambúrguer numa lanchonete 24h, e quem sabe... quem sabe ele teria coragem de beijá-la.
Ele sorriu ao imaginar a cena.
De repente, o murmúrio no salão mudou. A música pareceu ficar mais baixa. As cabeças de todas as pessoas importantes se viraram para a entrada principal, no topo da grande escadaria.
Bruno esticou o pescoço. Deve ser meu pai, pensou ele. O Rei chegou.
E, de fato, era Artur.
Artur estava impecável em um smoking preto sob medida. Ele parecia mais alto, mais imponente do que nunca. Mas, pela primeira vez em dez anos, ele não estava sozinho.
Ao lado dele, com a mão delicadamente apoiada no braço dele, estava Helena.
O sorriso de Bruno congelou no rosto.
O mundo parou.
Helena estava deslumbrante no vestido azul. Ela caminhava com a cabeça erguida, mas seus olhos varriam o salão, nervosos. Artur, por outro lado, irradiava orgulho. Ele não a escondia. Pelo contrário, ele a exibia. Ele caminhava devagar, cumprimentando as pessoas com Helena colada ao seu lado.
Artur: (Sussurrando para Helena) Respire. Você está perfeita. Todos estão olhando porque nunca viram alguém como você ao meu lado.
Helena apertou o braço dele. Ela se sentia poderosa, sim. Sentia os olhares de inveja e de admiração. Era viciante.
Mas então, seus olhos encontraram o canto do salão.
Ela viu Bruno.
Ele estava pálido. O copo de champanhe na mão dele estava inclinado, quase derramando. Ele olhava para ela não com raiva, mas com uma confusão absoluta, como se não conseguisse entender o que estava vendo. A mulher que riu com ele no bistrô... era a rainha do pai dele.
Helena sentiu um soco no estômago. Ela queria soltar o braço de Artur. Queria correr até lá e explicar. Mas não podia. Ela tinha feito sua escolha.
Artur seguiu o olhar dela e viu o filho.
Artur: Ah, o Bruno está ali. Vamos cumprimentá-lo.
Helena: (Num sussurro desesperado) Artur, não...
Mas Artur já estava caminhando naquela direção, puxando-a suavemente. Para Artur, aquilo era natural. Ele estava apresentando sua nova companheira à família. Ele não fazia ideia da guerra que estava começando.
Eles pararam na frente de Bruno.
Artur: Bruno. A gravata está torta, filho. — Artur disse isso com um tom paternal, mas superior. — Você já conhece a Helena, claro. Mas hoje... hoje ela é minha convidada de honra.
Bruno olhou para o pai. Depois olhou para Helena.
Os olhos de Helena pediam desculpas silenciosas. Sinto muito, diziam os olhos dela.
Mas os olhos de Bruno endureceram. A doçura do menino que desenhava em guardanapos sumiu. Em um segundo, algo quebrou dentro dele. E algo mais frio nasceu no lugar.
Bruno: (Com a voz seca) Claro. Convidada de honra.
Ele olhou para a mão de Helena entrelaçada no braço do pai.
Bruno: Vocês formam... um belo par. — Ele levantou o copo num brinde irônico. — Com licença. Perdi a fome.
Bruno deu as costas para eles e saiu andando rápido em direção à saída, esbarrando em um garçom e derrubando uma bandeja, mas nem olhou para trás.
Artur franziu a testa, sem entender.
Artur: O que deu nele? Sempre tão temperamental.
Ele se virou para Helena, sorrindo, alheio ao desastre.
Artur: Esqueça isso. A valsa vai começar. Me concede esta dança?
Helena olhou para a porta por onde Bruno tinha desaparecido. Depois olhou para Artur, o homem que podia dar a ela o mundo.
Ela engoliu o choro que estava na garganta, forçou um sorriso triste e assentiu.
Helena: Sim, Artur. Vamos dançar.
Enquanto a orquestra começava a tocar, Helena girava nos braços do pai, mas seu pensamento estava no filho que caminhava sozinho na rua escura, traído pelas duas pessoas que ele mais admirava.