Se ela estava na sala, ele aparecia na porta da cozinha, encostado no batente, apenas observando-a. Se ela ia para a varanda, ele aparecia para "fumar um cigarro", o olhar dele queimando sua nuca. Ele não dizia nada. Ele não tocava nela. Ele apenas... estava lá. Esperando. A presença dele era um peso físico, a cada respiração.
A tensão era tão espessa que Laura sentia dificuldade em respirar. A culpa era um manto sufocante, mas era estranhamente temperada por uma adrenalina excitante que ela não sentia há anos.
Por volta do meio-dia, Lucas desceu as escadas, já vestido, com pressa.
"Amor, estou indo no mercado", ele anunciou, alheio à eletricidade no ar. Ele já estava com as chaves do carro na mão e uma lista amassada. "Faltou carvão, e preciso buscar a picanha que encomendei. E, claro, mais cerveja."
O coração de Laura deu um salto de pânico. O pânico de ser deixada sozinha com o perigo.
"Agora? Eu... eu posso ir com você", ela disse, a voz subindo uma oitava.
Lucas sorriu, divertido. "Não, que isso, relaxa", ele disse, dando-lhe um beijo apressado na testa. "Eu sei que você odeia o mercado no sábado. Fica aí fazendo companhia pro Bruno. Eu não demoro. Uma hora, no máximo."
Ela tentou argumentar, mas a urgência nos olhos de Lucas para sair logo era maior do que sua necessidade de segurança.
"Vê se não come todos os aperitivos, Bruno!", Lucas brincou, dando um tapa amigável nas costas do amigo.
Bruno, que estava sentado na poltrona fingindo ler, levantou os olhos. Seus lábios se curvaram em um sorriso lento, mas seus olhos nunca deixaram os de Laura. O sorriso que ele deu para Lucas foi puramente predatório, mas Lucas, concentrado em sair, não viu.
"Pode deixar, Lu. A casa e a esposa estão em boas mãos", Bruno disse, a voz morna. A palavra 'esposa' soou deliberadamente irônica.
Laura sentiu um arrepio gélido e quente ao mesmo tempo.
Lucas pegou sua carteira. "Ótimo. Volto logo!"
O som da porta da frente batendo foi como um tiro de largada, sinalizando o fim da proteção. Laura ficou paralisada no meio da sala, ouvindo o barulho do motor do carro ligando, manobrando na garagem, e depois sumindo ao longe.
E então, o silêncio. Um silêncio que não era paz, mas sim a calma antes da tempestade.
Eram apenas eles