Eles não eram um casal comum. Se conheceram numa galeria de arte, ele, o herdeiro engomadinho da construção civil; ela, a arquiteta teimosa que achava o trabalho dele uma afronta à cidade. A primeira briga deles foi épica, pública e terminou com os dois se pegando no banheiro de um restaurante chique, rasgando as roupas de grife um do outro. Foi assim que começou. De atrito, de faísca. Eles eram viciados nessa energia explosiva.
O passado dos dois era feito de rotinas invertidas e segredos compartilhados. Tipo, as escapadas no meio da madrugada, dirigindo por horas só para ver o nascer do sol na praia e fazer amor na areia fria, sem ligar para a areia que arranhava. Ou o jogo que eles tinham de ir a eventos de gala, se portar como a realeza, só para quebrar todas as regras voltando para casa, com Silas a desabotoando as costas do vestido dela no elevador, sem paciência para esperar.
Naquela manhã, o sol batia forte, e a cena era de cinema. Elara estava na cozinha só de camisa de seda branca do Silas, a camisa folgada, quase caindo. A pele dela parecia reter o calor das noites mal dormidas. O cheiro dela – um misto de frescor cítrico com sal marinho, o perfume de "depois" – flutuava, misturando-se ao café forte.
Silas chegou por trás, devagar. Não era só o corpo dela que ele amava; era a cumplicidade. Era o fato de que só com ela ele conseguia ser o cara que não tinha que provar nada a ninguém.
— A cidade tá pegando fogo por sua causa, Silas — ela provocou, rindo, lembrando-o de que ele tinha uma reunião importante com uns engravatados.
— Que se exploda a cidade. Você é meu único incêndio. Lembra daquela noite no terraço, com o vinho? — ele perguntou, a voz rouca, reativando a memória de um momento onde eles quase foram pegos.
— Impossível esquecer. Quase deu ruim — ela sussurrou, mas os olhos avelã já estavam cheios daquela promessa que só o corpo dela fazia.
Ele a virou contra o mármore frio do balcão. Eles não precisavam de beijos longos, era a intensidade. O toque era um código, uma certeza. O café? Ficou esquecido, derramando. Para Silas, o amor e o sexo com Elara não tinham regra, não tinham tabu. Era a única coisa real na vida dele, o único ponto fixo. E era por isso que, quando sumiu, a dor virou um buraco negro.