O quarto de Joana era um santuário de desordem organizada. Marcos foi até a janela e ficou olhando para a rua escura, os braços cruzados com força. Joana acendeu a luz fraca de um abajur.
O silêncio durou quase um minuto. Foi ela quem o quebrou, a voz pouco mais que um sussurro. "Você... você viu quem era?"
"Não", respondeu Marcos, sem se virar. "Um estranho, Joana. Tinha um estranho no quarto da mamãe. Na cama do papai." A última frase saiu carregada de uma dor que era quase uma acusação.
Joana sentou-se na beirada da cama. Ela sentiu o peso daquelas palavras, mas por um motivo que Marcos talvez não estivesse percebendo. "E nós, Marcos?", ela disse, a voz tão baixa que ele quase não ouviu. "Nós temos o direito de julgar o que acontece na cama de alguém?"
A pergunta o atingiu como um soco. Ele se virou lentamente, o rosto pálido. A raiva em seus olhos foi substituída por uma sombra de vergonha e memória. Ele entendeu imediatamente.
"Isso não tem nada a ver, Joana", ele murmurou, mas a convicção havia sumido.
"Não tem?", ela insistiu, levantando-se e se aproximando. Ela não era acusatória, apenas... cansada. "Você está chocado porque ela tem um segredo? Porque ela fez algo que não deveria? Nós também fizemos, Marcos. Ou você já esqueceu?"
Ele desviou o olhar, incapaz de encará-la. "Aquilo foi diferente. Foi uma vez só. A gente era mais novo."
"Mas aconteceu", ela afirmou, parando na frente dele. "E é nosso segredo. Assim como esse, agora, é o segredo dela."
O quarto ficou em silêncio novamente, mas agora um silêncio diferente, preenchido não apenas pelo choque daquela noite, mas pelo fantasma de outra. A hipocrisia da situação pesava sobre eles. Como poderiam apontar o dedo para a mãe quando as próprias mãos deles não estavam limpas? O ato dela, de repente, parecia menos um crime e mais... humano. Falho. Complicado. Exatamente como o deles.
A raiva de Marcos se dissipou, dando lugar a um cansaço profundo. Ele se sentou na cadeira onde as roupas de Joana estavam jogadas. "O que a gente faz?", ele perguntou de novo, mas desta vez a pergunta era sobre tudo. Sobre a mãe. Sobre eles.
Joana se ajoelhou na frente dele, forçando-o a olhá-la. "O mesmo que a gente fez daquela vez", ela sussurrou, a cumplicidade entre eles mais forte do que nunca. "A gente não diz nada. A gente guarda. É o que a gente faz. A gente guarda os segredos um do outro."
Ele assentiu, a compreensão passando entre eles. O laço que os unia não era mais apenas de fraternidade, mas de uma transgressão compartilhada. Eram espelhos um do outro. Naquela noite, ao descobrirem o segredo da mãe, eles foram forçados a revisitar o próprio.
"Só nós dois", ele repetiu o antigo juramento, mas agora com um significado infinitamente mais pesado.
Maravilhoso... Não vejo hora de ler a continuação! Obrigado por compartilhar